Não
é a abundância ou escassez relativa de assuntos de actualidade que dita a
escolha que faço dos temas que vou propondo aos leitores deste jornal. Há até
ocasiões em que a multiplicidade de temáticas que vão emergindo no dia-a-dia e/ou
a respectiva incomodidade político/social me inibem da escolha de algum. Nessas
circunstâncias, a opção que acabo por fazer é quase sempre intuitiva e de
última hora.
Isso
voltou a acontecer-me na hora de escrever o presente artigo. Antecedendo o
momento crítico da decisão, equacionei voltar a referir-me à má gestão da
economia que o país vai tendo, à deplorável qualidade dos políticos que vão
percorrendo os corredores de S. Bento, à cena já vista de sindicalistas que se
vendem a troco de 30 dinheiros ou menos, numa sofreguidão difícil de descrever
de mostrar serviço aos seus patrões do governo e das confederações patronais.
Olhando João Proença, não pude deixar de recordar Torres Couto, há bastantes
anos e numa altura em que ainda não éramos capazes de crer que fosse possível
ver degradar tanto a economia e a qualidade da governação do país.
No
momento decisivo da escolha do assunto cheguei a ter quase tomada a opção de
fazer uma breve recensão de um livro colectivo (sobre “Governança Territorial e
Desenvolvimento: uma introdução ao tema”; edição Garamond, Brasil) que virá a
público dentro de poucos dias, e que tem como coordenador Valdir Roque
Dallabrida, um professor universitário brasileiro com quem partilho muitas
afinidades científicas e com quem vou mantendo correspondência regular. Equacionei
falar sobre um livro sobre governança, digo, “que é um termo utilizado por
diferentes áreas do conhecimento […] nem sempre com o mesmo sentido”
(Dallabrida, 2012).
No
último instante, no entanto, instintivamente, deixei-me resvalar para o tema
“What makes an entrepreneur? The role of feelings” (O que é que torna alguém
empresário? O papel dos sentidos), o que, feita a tradução, resulta numa
expressão bastante ambígua. Muito menos ambígua será a problemática que está
por trás desse título, que se prende com a questão de saber se é de natureza
intuitiva ou racional a decisão que leva alguém a criar uma empresa ou, se
quiserem, a ser empreendedor.
Esta
foi a questão central a que se propôs responder o meu filho José Pedro Cadima na
dissertação de mestrado que defendeu na passada 6ª feira na Faculdade de
Economia da Universidade Nova de Lisboa, desde há poucos meses redenominada Nova School of Business and Economics,
para, entre outras coisas, estar em maior consonância com o ensino em língua
inglesa que pratica nos seus cursos de pós-graduação, pelo menos.
A
minha vontade de acompanhar este meu filho nesse momento marcante do seu
percurso académico levou-me a Lisboa nesse dia e a emoção do instante, junto
com a curiosidade que a problemática científica em análise me suscita desde os
remotos anos em que me cruzei pela primeira vez com o pensamento de Joseph
Schumpeter ditaram a definitiva resolução em termos de escolha do tema para o
artigo do Jornal de Leiria com que me vinha confrontando.
A
dissertação faz uso de dados sobre a realidade empresarial nacional e, na
componente analítica, explora a eventualidade de ser possível distinguir os
perfis psicológicos (traços) e influência da rede de contactos sociais dos
criadores de empresas e dos de outros detentores de capital e gestores de
empresas. As conclusões não põem em causa o que é genericamente retido pela
literatura científica da especialidade.
Em
termos breves, resulta evidenciado que, embora os empreendedores não difiram
substancialmente dos comuns proprietários de empresas (por herança ou por
simples participação no capital de negócio já existente), são influenciados pelas
circunstâncias enquadrantes (formação académica, ligações sociais: familiares,
rede social geral) de forma diferente dos demais nas decisões que tomam quando
está em causa a criação de uma empresa. Isto é, a componente intuitiva toma nos
primeiros um peso maior no momento da tomada de decisão sobre o lançamento de
um (novo) negócio.
Dizendo
de outro modo, é do senso comum que distintos indivíduos reagem de modo
diferente a realidades de partida iguais. Do mesmo modo se poderá inferir que
diferentes indivíduos retirarão ilações diferentes de realidades análogas. É na
capacidade de perceber oportunidades de mercado onde o comum dos sujeitos não
as pressente que o empreendedor Schumpeteriano se distingue dos demais
indivíduos.
Aqui
chegado, como deixei dito, estava resolvida a dificuldade que me atormentou
toda a passada semana.
J. Cadima Ribeiro
(artigo de opinião a publicar em próxima edição do Jornal de Leiria, no quadro de colaboração regular)