Espaço de debate de temas de Economia Portuguesa e de outros que com esta se relacionam, numa perspectiva de desenvolvimento

quarta-feira, março 28, 2007

Contenção da despesa pública e bem-estar económico em Portugal

Na mesma semana em que o Instituto Nacional de Estatística anunciou o valor do défice do orçamento de Estado português referente ao exercício de 2006 (3,9 % do PIB do mesmo ano), o semanário Expresso (07/03/24) publicou dois artigos, assinados, respectivamente, por Fernando Madrinha e Nicolau Santos, em que se falava do que havia sido conseguido em matéria de consolidação orçamental e se questionava o devir.
As análises convergiam em muito, sendo que Nicolau Santos ia um pouco mais longe no questionamento dos caminhos a percorrer, sublinhando, em particular, que “se este resultado é muito bom, convém que não haja ilusões, porque não está consolidado”. Acrescentando de seguida que “a carreira dos funcionários públicos não pode permanecer indefinidamente congelada. A forte contenção salarial não pode ser eterna. E cortar sistematicamente no investimento público não é modelo que se recomende”.
É por aqui que quero pegar para reafirmar o ponto de vista que há muito defendo de que a gestão deste desequilíbrio pelo lado das políticas de estabilização é pouco mais do que um faz-de-conta, em que o que se ganha num lado – aumento a receita fiscal, por exemplo – se perde no outro, no desestímulo que daí resulta para a actividade económica e no incentivo à fuga ao fisco. Felizmente para o governo em funções, esta última componente foi eficazmente combatida pelo ganho de eficiência da máquina fiscal mas, aqui chegados, pouco mais estará ao alcance do governo fazer já que, doravante, os mecanismos de fuga com que se confrontará serão bem mais sofisticados e, nalguns, mesmo formalmente legitimados (por exemplo, “paraísos fiscais”).
Ironicamente, esse resultado em matéria de cobrança de impostos fica muito a dever-se ao investimento feito em matéria de sofisticação técnica da máquina fiscal e de qualificação da estrutura de direcção, que amiúde emergiu para a opinião pública em termos de polémica em torno de salários pagos, nomeadamente ao seu Director-Geral.
Esta situação ilustra na perfeição o beco sem saída do modelo de reforma das contas públicas que questiono. A seu modo, são também as questões que Nicolau Santos enuncia na citação que faço acima, mais ou menos secundado por Fernando Madrinha na frase onde diz que “muitos milhares de portugueses têm sofrido os tormentos dessa vitória”, do governo, esclareça-se (para atingir os resultados em matéria de défice anual que são indicados).
O chamar desta dimensão da gestão da economia para primeiro plano permite, adicionalmente, pôr em relevo que uma parte dos problemas que a economia portuguesa enfrenta não são senão o resultado de erros de política, que se vêm sucedendo há vários anos, ao mesmo tempo que abre espaço para a afirmação de que soluções duradouras não relevam destas políticas mas das de natureza estrutural, quer dizer, daquelas que são necessárias implementar para que o país altere de vez o seu perfil produtivo, habilitando-o a ser mais competitivo nos mercados globais, e cresça de forma visível e sustentada. Só o crescimento económico do país acrescenta recursos e empregos e gera receitas fiscais líquidas adicionais.
A crise da economia portuguesa é essencialmente uma crise estrutural e não uma mera diminuição do crescimento do produto. Essa leitura de situação será das poucas coisas que faz consenso entre os economistas nacionais, e não só. Como crise estrutural, como disse já, tem que ser atacada com remédios da mesma natureza.
Portugal foi dos países mais afectados pela abertura da economia da União Europeia (UE) negociada em sede da Organização Mundial do Comércio. É também um dos países mais afectados pelo alargamento da UE a Leste. Dito de outro modo, encontra-se confrontado com uma enorme mudança dos factores de competitividade e de desafios que tem que vencer a partir de um posicionamento nos mercados distinto do subsistente no passado das suas empresas, dos seus territórios e, obviamente, da sua administração pública, como parte que é de um novo projecto de inserção do país na divisão internacional do trabalho.
Para tanto, como considerava o GEPE - Gabinete de Estudos e Prospectiva Económica, do Ministério da Economia, em análise recente (2006), Portugal precisa de “desenvolver a flexibilidade e a adaptabilidade das estruturas económicas e sociais de forma dinâmica e sustentável”, sendo sabido que tudo isto passa: i) pela iniciativa e eficácia das empresas, na resposta à evolução da procura de bens e serviços nos mercados nacional e internacional; ii) pela qualidade dos recursos humanos ao dispor das empresas e da administração pública, no contexto de globalização e de mudança acelerada assinalado, onde, portanto, a única resposta possível tem que apostar na flexibilidade de resposta, na antecipação e em fazer diferente e, se possível, melhor; e iii) por políticas estruturais orientadas para a eficiência, a formação e a qualificação dos recursos humanos, o desenvolvimento regional e a modernização das infra-estruturas e dos serviços prestados pela administração pública.
Concluindo, uma resposta duradouro aos problemas do país, incluindo neles o desequilíbrio das contas públicas, não tem resposta fora de uma política de incentivo à criação de novas empresas, de novas marcas, de novos produtos e à consolidação das existentes. Aumentar a quantidade de produtos e serviços que tenham potencial de ser exportados ou explorados nos mercados externos e a capacidade de concorrer com operadores internacionais no mercado nacional é o caminho a trilhar. Quando alcançarmos uma posição sólida nesse percurso, teremos resolvido solidamente os desequilíbrios de contas públicas e de contas externas que nos toldam o nosso presente, enquanto economia e enquanto nação.
Neste percurso em direcção ao futuro nem tudo se joga no âmbito das decisões e das políticas económicas. A componente cultural e a pedagogia política terão que cumprir a sua parte. As atitudes têm que mudar, libertando-se de acomodações e de dependências, e o discurso político necessita ser muito mais pedagógico e verdadeiro.

J. Cadima Ribeiro

quarta-feira, março 21, 2007

A Espuma da Asneira

Este título é inspirado num outro encontrado num livro da autoria de Paulo Vaz, recentemente editado pelo CENESTAP (Centro de Estudos Têxteis Aplicados), com sede em Famalicão. A obra é uma colectânea de textos do mencionado autor, divulgados ao longo dos derradeiros anos em variadas publicações, mas especialmente no Jornal Têxtil. O título original (do artigo, que não do livro) é “ A espuma da crise”, e, como se pode presumir, o autor reportava-se à situação económica e psicológica que grassava em Portugal na ocasião em que o escreveu e que, infelizmente, no essencial, se mantém. Conforme também se depreenderá do contexto que se enuncia, o elemento organizador da análise é a fileira têxtil/confecções. O livro contém, não obstante, reflexões que extravasam a problemática sectorial.
A invocação do livro e do subtítulo não são feitas aqui como ponte de partida para uma recensão da obra, que obviamente será susceptível de múltiplas críticas, como qualquer outra. É, antes, pretexto para sublinhar um estado de situação e uma qualificação para a gestão da economia portuguesa feita pelo governo em funções. É verdade que nisso, diga-se, nada me liga à crença que Paulo Vaz alimentou no alvorecer do mandato do Dr. Durão Barroso.
Nessa postura, reflectia eu o cepticismo de quem desconfia(va) daqueles que só encontram forma de se afirmação na crítica da acção passada, carregando as notas negativas de uma gestão infeliz, conduzida por infelizes interpretes. E reflectia a desconfiança de quem já assistiu inúmeras vezes ao renomear de programas públicos para os fazer parecer diferentes ou dar a ideia de que dispõem de mais dinheiro do que aquele que efectivamente dispõem – não foi em vão que um economista já falecido se referiu a estes programas, vai para mais de uma década, como conjuntos vazios. E reflectia, adicionalmente, o cepticismo e o desencanto de ver apresentados como ministros e seus “ajudantes” figuras que atravessaram anteriores consolados deixando marcado um rasto de destacado cinzentismo.
Devo entretanto reconhecer que a realidade, como poderia dizer-se, claramente superou o que se poderia ficcionar. Ilustrando a partir da minha própria vivência, retenha-se o exotismo de um ministro se ter deslocado à AIMinho, no início do seu mandato, para apresentar um programa de apoio público (redenominado) e lá ter voltado para o apresentar um ano e meio depois rigorosamente no mesmo estádio de desenvolvimento do ponto de vista de implementação. Um outro exemplo, trazido a público recentemente, mostrava a competência conjugada de duas ministras que tardaram um ano a resolver o problema de enquadramento laboral de alguns centenas de técnicos ao serviço de um dos ministérios em causa, sendo que uma das ditas ministras reteve os descontos para a protecção social desses trabalhadores até que o escândalo foi tornado público pelos media.
Foi esta competência e esta eficácia que conduziu à decisão de elevar a taxa de IVA há quase dois anos, quando das coisas mais básicas que um professor tem para transmitir aos seus alunos no lançamento de um curso de economia é, precisamente, que o resultado expectável de um aumento da fiscalidade a partir de certos níveis (elevados) é a redução da receita associada. Para mais, num quadro instalado de reiterado incumprimento e de incapacidade ou inoperância da máquina fiscal. É desta mesma competência e deste mesmo alcance estratégico que se fala quando se conduz meses a fio uma campanha destinada a instalar um sentimento de incerteza e pessimismo nos agentes económicos e no comum dos cidadãos, enquanto simultaneamente se pretende incrementar a receita, e se alimenta a ilusão de que o reganhar da confiança (e o retomar do crescimento económico, fortemente devedor daquela) se consiga com um simples estalar de dedos, no momento politicamente conveniente para o poder instalado.
Noutras áreas da governação avultam, bem assim, os exemplos do que não se deve fazer e confirma-se a convicção da ausência de um projecto para o país, seja numa acepção económico seja mesmo numa acepção política que vá para além da estrita ocupação de cadeiras. Retornando à ilustração, um caso tão chocante quanto os antes enumerados foi o da imposição da redução dos numerus clausus do acesso ao ensino superior público no ano lectivo que está a correr, para se vir concluir agora, pela voz da própria ministra da tutela, que subsiste um défice importante em matéria de qualificação superior e de investimento em investigação e desenvolvimento em Portugal. As limitações daí derivadas em matéria de competitividade da nossa economia são algo que já faz parte do censo comum. Para além de desvario da gestão casuística, esse é também um resultado de quem julga poder poupar sacrificando o investimento. Este é, dizia, só um exemplo mais, entre muitos.
É por tudo isto que parece apropriado invocar aqui a figura da espuma, que, neste caso, ao invés de branca se oferece bem colorida. É a cor da asneira. Daí a espuma da asneira.

J. Cadima Ribeiro
(texto datado de 2004/02/19)

terça-feira, março 13, 2007

"Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso" - V

«Apresentação pública do livro
“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso”, Manuel Carlos Silva, Ana Paula Marques e Rosa Cabecinhas (Orgs.), edição do Núcleo de Estudos em Sociologia, Universidade do Minho, e da Editora Inovação à Leitura, Braga, 2005(?).
[...]

3. Os destaques deste leitor
3.3. O terceiro tópico que queria endereçar de forma específica é a regionalização, introduzida fugidiamente por Miguel Melo Bandeira no seu texto (p.155). Escreve aquele:
- “[…] o nosso interesse […] remonta ao tempo em que o debate sobre a regionalização […] se reconhecia ainda pela supremacia da racionalidade teórico/técnica sobre o da pragmática político/partidária. Pelo contrário, hoje em dia […] a temática perdeu muito do seu brilho e alcance político real, entre outras razões incontornáveis, por se ter subestimado a sua dimensão cívica, em resultado do qual o debate se circunscreveu ao âmbito redutor da conflitualidade formal político-partidária. […]. Fatalidades de uma democracia que já dá sinais de envelhecimento precoce?!”. Questiona Miguel Bandeira, a rematar a sua reflexão.
Eu acrescentaria: Pois!!!

Retenho este tema porque ele se prende estreitamente com a nova abordagem ao desenvolvimento dos territórios que menciono alguns parágrafos atrás. Dessa visão, sublinhem-se as seguintes ideias estruturadoras:
i) “o sistema produtivo dos países cresce e transforma-se utilizando o potencial de desenvolvimento existente nos territórios”;
ii) “para que a realização das tarefas ou actividades se desenvolva a um nível elevado de eficiência, é crucial que os territórios disponham de competências;
iii) “são as competências para tirar partido da dotação existente em recursos produtivos que constituem a origem da vantagem competitiva dos territórios.”
Se assim é, resta dizer que entre os recursos dos territórios também se incluem os recursos de natureza institucional (governos locais e regionais; base associativa empresarial e social, câmaras de comércio, etc.) e as competências, quer dizer, a capacidade de tirar partido da malha institucional, existente e a desenvolver, para concretizar um desempenho “a um nível elevado de eficiência”.
É a esta luz que é necessário que se entenda que o económico, o cultural, o institucional são tudo peças do mesmo projecto visando o desenvolvimento das regiões, dos territórios, ainda que o exercício político autónomo local e regional não fossem afirmações não-negociáveis de democracia e de cidadania.
Por isso, quando recentemente um responsável político regional minhoto, de primeira linha, me questionou sobre por onde começar na construção de uma resposta aos problemas de desenvolvimento com que a região se confronta, eu não tenha hesitado em apontar-lhe a esfera política, melhor dizendo, a aposta na criação de uma liderança clara, a partir do sentimento de comunidade.

4. Concluindo: a certeza de valer a pena o debate e o questionamento das coisas.
Concluo, que já vou longo - mesmo que esteja consciente de não ter feito justiça ao valor acrescentado que a obra trás para o debate do tema que se propôs tratar e, muito menos, aos autores dos textos que a integram. Concluo, digo, recuperando o sublinhado já deixado de que estamos perante uma colectânea de textos que merece interesse, seja pela variedade de objectos analíticos e de áreas científicas que acolhe e, seja pela coerência e complementaridade dos contributos. Numa obra desta natureza, tem, obviamente que perceber-se e aceitar-se que uns textos e reflexões se apresentem mais consolidados que outros.
Se vos posso dizer alguma coisa sobre que esteja seguro, remato com a certeza de valer a pena o debate e o questionamento das coisas, para o qual este livro dá um modesto mas valioso contributo.

J. Cadima Ribeiro
(extracto final de texto produzido no contexto que fica explicitado no cabeçalho)

sábado, março 10, 2007

“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso” - IV

«Apresentação pública do livro
“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso”, Manuel Carlos Silva, Ana Paula Marques e Rosa Cabecinhas (Orgs.), edição do Núcleo de Estudos em Sociologia, Universidade do Minho, e da Editora Inovação à Leitura, Braga, 2005(?).
[...]

3. Os destaques deste leitor
3.2. O segundo destaque de leitura refere-se à forma como os tecidos produtivos evoluem e como as estratégias de mobilidade social se conjugam com a configuração dos ditos tecidos produtivos locais/regionais.
Recupero, a esse título, a passagem do texto de Fernando Bessa Ribeiro (p.108) onde se diz que “Este aspecto permite, em parte, perceber o processo de diversificação industrial verificado em Águeda alguns anos antes […]. Ferragens e bicicletas são actividades metalúrgicas com técnicas e saberes muito próximos, pelo que, existindo condições de mercado propícias, rapidamente se desencadearia a actividade industrial no sector das bicicletas”. E recupero, de idêntico modo, uma outra (p.108/9), a saber: “Da comercialização à industrialização ia um pequeno passo, atendendo a que existia uma longa tradição metalúrgica […]”.
Uma e outra invocação levam-me aos resultados da minha (própria) investigação. Concretamente, no 1ª caso, a uma das conclusões centrais da tese de doutoramento que defendi vai para quase 20 anos, e que se exprime na ideia que, em regra, “o futuro se afirma a partir das traves-mestras (legados) do passado e segundo as directrizes do presente” (Cadima Ribeiro, 1989), isto é, que, quando se considera a evolução económica do Minho, como era o caso em análise - incluindo a sua e progressão industrial - facilmente somos reconduzidos às teses de F. Braudel e outros de rejeição das ideias de ruptura, linearidade e inelutabilidade dos processos de industrialização.
Ainda tendo presente os resultados da minha investigação - na circunstância, um pequeno projecto de 1991 sobre “O tecido empresarial do Minho -, valerá a pena, a propósito, lembrar que os promotores de novos projectos empresariais identificados apresentavam como perfil o seguinte:
i) 55,3%, haviam sido antes quadros administrativos (aqui incluídos os agentes comerciais);
ii) 25,4% provinham do grupo dos patrões e chefes de empresa;
iii) 15,8% tinham sido previamente técnicos assalariados; e
iv) 3,5% eram originários de outras categorias sócio-profissionais.
A presença que se anota da categoria quadros administrativos “põe em destaque o acesso à informação sobre os mercados, a convivialidade com as redes de distribuição e seus agentes como importantes elementos desencadeadores da iniciativa empresarial autónoma” (Cadima Ribeiro, 1991, p.6).»
J. Cadima Ribeiro
(extracto de texto produzido no contexto que fica explicitado no cabeçalho)

quinta-feira, março 08, 2007

“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso” - III

«Apresentação pública do livro
“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso”, Manuel Carlos Silva, Ana Paula Marques e Rosa Cabecinhas (Orgs.), edição do Núcleo de Estudos em Sociologia, Universidade do Minho, e da Editora Inovação à Leitura, Braga, 2005(?).
[...]

3. Os destaques deste leitor
3.1.
Os economistas clássicos, T. R. Malthus (1798) e David Ricardo (1817), em particular, alimentavam uma perspectiva pessimista sobre a sustentatibilidade a longo-prazo do crescimento das economias capitalistas (queda tendencial da taxa de lucro; perspectiva da emergência do estado estacionário). É tendo presente esse pano de fundo que Ricardo desenvolve a teoria das vantagens comparativas do comércio internacional, solução – derradeira - o comércio internacional, digo - para contrariar o aumento do custo das “subsistências” da força de trabalho industrial.
Os princípios que sustentam a liberalização actual do comércio internacional sob a égide da Organização Mundial do Comércio (OMC) têm aí o seu suporte fundador. A globalização não é senão o triunfo do modelo de divisão internacional de trabalho que daí decorre, estendido à escala mundial, reforçado pelos elementos político-estratégicos subsistentes no nosso tempo.

Deixando os países e falando, ao invés, de territórios, a grande questão que se coloca é saber como estes, se se quiser, as regiões, podem tirar proveito desta realidade para se desenvolverem ou, em situação limite, sobreviverem. Tenha-se presente, a este respeito, a ideia crescentemente partilhada de que os países competem através das suas cidades, dos seus territórios e, daí, que as estratégia de desenvolvimento das cidades (das regiões, dos territórios) devam ser o elemento nuclear de qualquer estratégia de competitividade e, portanto, também, de desenvolvimento nacional.
O pensamento que se invoca, assumidamente ou não, é devedor de um novo modelo de pensar o território no qual este surge como espaço activo, expressão da confluência de interesses e acções de uma plêiade de actores económicos, políticos e instituições: o desenvolvimento parte da mobilização de recursos endógenos e das capacidades das comunidades, em obediência a objectivos de bem-estar das populações.
Este modelo é a contraposição da visão “tradicional” (modelo funcionalista), na qual o território se sugeria como um espaço neutro (realidade abstracta), relativamente desprovida de recursos (especialmente capital) e de competências e, por isso, devedora da iniciativa, dos recursos e da liderança de elites centrais (nacionais ou internacionais).
O protagonismo reclamado para a dimensão territorial sugere-se não só em expressão da ancoragem espacial dos processos organizativos e tecnológicos mas, igualmente, da circunstância de qualquer localidade ou região se oferecer como o resultado de uma história que foi configurando a sua realidade económica, cultural e institucional. Daí resulta uma concepção igualmente renovada da política regional ou, melhor, das políticas de desenvolvimento regional.»

J. Cadima Ribeiro
(extracto de texto produzido no contexto que fica explicitado no cabeçalho)

terça-feira, março 06, 2007

“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso” - II

«Apresentação pública do livro
“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso”, Manuel Carlos Silva, Ana Paula Marques e Rosa Cabecinhas (Orgs.), edição do Núcleo de Estudos em Sociologia, Universidade do Minho, e da Editora Inovação à Leitura, Braga, 2005(?).
[...]

2. Diversidade e complementaridade de propostas do livro: unidade na diversidade?
Na variedade de objectos analíticos e de áreas científicas que acolhe, cumpre salientar a coerência e complementaridade dos textos disponíveis, cruzando-se enfoques e debatendo-se vivências que atravessam os espartilhos disciplinares. Retenho, a esse título, aparte o elemento agregador que são as assimetrias/desigualdades espaciais:
i) a invocação do significado e importância económica e social da pluriactividade, presente em Fernando Bessa Ribeiro, a propósito de Águeda, e em Manuel Belo Moreira (As assimetrias da estrutura agrária portuguesa …);
ii) a análise da Escola como instrumento de mobilidade social, presente em José Portela (sonhos de pais e filhos, escola e assimetrias sociais …) e em Ricardo Campos e Renato Carmo (A construção de estratégias de acesso ao ensino superior...); e
iii) a complexidade dos fenómenos sociais e das leituras que deles se podem fazer, como aparece abundantemente sublinhado em Ricardo Campos e Renato Carmo (A construção de estratégias de acesso ao ensino superior ...), mas também em Conceição Nogueira, a respeito da igualdade entre homens e mulheres em Portugal, em José Portela, reportando-se às diversas escolas que formam a pessoa e o “cidadão”, em Manuel Belo Moreira (As assimetrias da estrutura agrária portuguesa …) ou em Miguel Bandeira, na invocação que faz da fronteira e dos territórios transfronteiriços e, antes disso, ainda que brevemente, dos posicionamentos de diversos agentes perante a regionalização do país e o seu papel como instrumento de desenvolvimento.
Aparte limitações de reflexões e trabalhos de investigação que estavam em curso na ocasião (uns mais exploratórios que outros) e que, a pretexto de uma conferência científica, foram tornados disponíveis, fica o debate e o fórum de discussão de que o livro agora publicado dá notícia e gera a oportunidade de prolongar.»
J. Cadima Ribeiro
(extracto de texto produzido no contexto que fica explicitado no cabeçalho)

segunda-feira, março 05, 2007

“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso”

Apresentação pública do livro
“Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudos de caso”, Manuel Carlos Silva, Ana Paula Marques e Rosa Cabecinhas (Orgs.), edição do Núcleo de Estudos em Sociologia, Universidade do Minho, e da Editora Inovação à Leitura, Braga, 2005(?).
Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, Braga, 5 de Março de 2007

«Estrutura do comentário/da apresentação do livro:
i) Paradigmas teórico-conceptuais paralelos e leituras diferenciadas dos mesmos objectos analíticos;
ii) Diversidade e complementaridade de propostas do livro: unidade na diversidade?
iii) Os destaques deste leitor;
iv) Concluindo: a certeza de valer a pena o debate e o questionamento das coisas.

1. Paradigmas teórico-conceptuais paralelos e leituras diferenciadas dos mesmos objectos analíticos
Há cerca de uma dezena e meia de anos (Outubro de 1992), realizou-se na Universidade do Minho, em Gualtar, o I Encontro Nacional de Economia Industrial, que, entre outros, contou a presença de um professor e investigador português que trabalha nos EUA. O paradigma em que se filia(va) o dita professor é, assumidamente, o neoclássico, versão revista e actualizada.
O que me impressionou sobremaneira na sua intervenção na citada conferência foi a circunstância de tudo o que discorria em matéria de análise económica e teoria do crescimento – e tratava-se das últimas novidades teórico-conceptuais avançadas pela corrente em que se filiava - me fazer lembrar leituras que eu fizera e autores que conhecia, referenciados ao final dos anos cinquenta do séc. XX, e seus continuadores.
Chegada a hora do debate, protegido pela minha irreverência académica, atrevi-me a questioná-lo sobre se havia lido François Perroux, Albert Hirschman ou Gunnar Myrdal, economistas heterodoxos que foram os fundadores da corrente de pensamento designada do crescimento desequilibrado. Pareceu-me surpreso com a pergunta, admitindo de seguida que não.

Invoco nesta altura esta situação por, nalguma medida, ter sentido similar desconforto quando peguei no livro que é suposto aqui apresentar e/ou comentar, “Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudo de caso”, particularmente, lendo o texto assinado por Manuel Carlos Silva e António Carlos Cardoso. Ao paralelismo de leituras de autores que conheço, somam-se algumas divergências de notação e conceptuais de que dei conta (porventura, neste último caso, em razão de limitações das traduções das obras que tomaram como referências).

Obviamente que seria sempre de esperar que sentisse algum desconforto, confrontado que era com uma colectânea de textos que, salvo erro, acolhem um único economista, Eugénio Rosa. Devo-vos dizer, no entanto, que outro tanto não seria de esperar que resultasse da temática organizadora dos contributos retidos, “Desenvolvimento e assimetrias sócio-espaciais: perspectivas teóricas e estudo de caso”, por ser, em grande medida, o meu próprio objecto de investigação e análise. Aliás, julgo que essa terá mesmo sido a razão que levou os organizadores do livro a convidar-me para fazer esta apresentação/este comentário.
Esta minha afinidade temática prolonga-se na amizade e/ou conhecimento de diversas lides que tenho com/de diversos dos autores cujos contributos estão disponíveis, de Miguel Melo Bandeira, Paula Cristina Remoaldo e Manuel Carlos Silva a José Portela.»

J. Cadima Ribeiro

(extracto inicial de texto produzido no contexto que fica explicitado no cabeçalho)

A vida continua!

Esgotado o pretexto que esteve na origem da criação deste "jornal de parede", porque a vida continua, decidi-me a fazer deste espaço um repositório de textos que, a pretextos diversos, vão sendo produzidos e que , muitas vezes, ficam a aguardar oportunidade de maior divulgação, isto é, de serem divulgados em contextos distintos daqueles que estiveram na sua origem. Se com a sua divulgação neste espaço for possível gerar alguma discussão, tanto melhor.
Não se espere, no entanto, mais do que contribuições esparsas, ao ritmo de uma dinâmica externa a este projecto de fórum.
J. Cadima Ribeiro