Jornal de Leiria
Resposta às questões colocadas pela jornalista Mª Anabela Silva, em 09/06/30
1 - Se entre o Litoral e a fronteira são pouco mais de 100 quilómetros, porque é que há uma diferença tão acentuada entre o Litoral e o Interior?
R: Em termos remotos, a rarefacção de populações nas zonas raianas (raia seca, sobretudo), foi um dos resultados da conflitualidade histórica existente entre o Reino de Portugal e o de Castela e Leão. Viver de costas voltadas era criar uma barreira em matéria de povoamento, dotação de infra-estruturas e de oportunidades de emprego e de desenvolvimento desses territórios.
Mais tarde, em função da orientação para o mar do país, da respectiva abertura económica ao exterior tomando o mar como principal canal comercial e de relação, esse efeito tendeu a aprofundar-se. Mais recentemente, a dotação de infra-estruturas e serviços, a criação de emprego público e privado, uma política suportada na ideia da concentração de esforços nas zonas em que supostamente mais proveito se poderia retirar dos investimentos a fazer, por força das economias externas e de escala existentes, ditou em grande medida a situação a que chegámos.
A lógica política também ajudou: investe-se onde há votantes na esperança de que estes retribuam a “atenção” dos governos. Quem não tem poder eleitoral não conta. O círculo vicioso da pobreza e da desertificação do “interior” vai-se auto-alimentando. Um exemplo bem vivo desta lógica de fazer política foi o encerramento de maternidades e de outros serviços de saúde em diversas regiões do país: encerraram-se serviços com o argumento do insuficiente número de utentes; uma vez encerrados estes e outros serviços, restará às populações abandonadas à sua sorte procurarem esses mesmos serviços nos principais centros urbanos do litoral.
2 - O que pode ser feito para esbater as diferenças entre o Interior e o Litoral?
Uma coisa básica que se pode fazer é assumir o princípio da solidariedade interterritorial, isto é, à semelhança do que os países da União Europeia fazem para com os países economicamente mais frágeis da União, transferir recursos e apoios ao desenvolvimento para estas regiões. Isso faz-se, por exemplo, invertendo a lógica de desqualificação dos serviços e infra-estruturas destes territórios. Faz-se, também e sobretudo, através do reforço da dotação de serviços e da atractividade de alguns centros urbanos do interior, estrategicamente posicionados. Faz-se, por outro lado, olhando para os recursos e capacidades endógenas desses lugares e pensando o respectivo desenvolvimento a partir do aproveitamento desses recursos e competências, ao invés de olhar para eles como desertos ou lugares que, para se desenvolveram, só lhes resta imitar o modelo económico doutros lugares, no nosso caso, do litoral.
3 - Que mais-valias/vantagens poder ter o interior?
Como deixo dito, o interior tem recursos mais ou menos abundantes que podem ser aproveitados e valorizados em matéria de desenvolvimento, desde o património cultural (monumental e imaterial) aos espaços naturais, desde produtos agrícolas singulares aos recursos do subsolo. Nalguns casos, tem até tradição industrial e alguma capacidade financeira associada às remessas da emigração. É a partir daqui que se pode pensar o desenvolvimento. A política de cidades e uma infra-estruturação consequente farão outra parte.
Acresce que hoje em dia, quando a comunicação e o comércio tomam sobretudo o caminho do centro da Europa, estar no interior ou na fronteira não é um elemento penalizador. Pelo contrário, é uma oportunidade de acesso a mercados mais alargados que os locais/regionais, é a vantagem da vizinhança com populações/visitantes potenciais de “fora de portas”. É a oportunidade de ver valorizado em termos económicos territórios menos desordenados e mais preservados na sua autenticidade que outros que, em nome do desenvolvimento, se deixaram descaracterizar.
Évora, 30 de Junho de 2009
J. Cadima Ribeiro
R: Em termos remotos, a rarefacção de populações nas zonas raianas (raia seca, sobretudo), foi um dos resultados da conflitualidade histórica existente entre o Reino de Portugal e o de Castela e Leão. Viver de costas voltadas era criar uma barreira em matéria de povoamento, dotação de infra-estruturas e de oportunidades de emprego e de desenvolvimento desses territórios.
Mais tarde, em função da orientação para o mar do país, da respectiva abertura económica ao exterior tomando o mar como principal canal comercial e de relação, esse efeito tendeu a aprofundar-se. Mais recentemente, a dotação de infra-estruturas e serviços, a criação de emprego público e privado, uma política suportada na ideia da concentração de esforços nas zonas em que supostamente mais proveito se poderia retirar dos investimentos a fazer, por força das economias externas e de escala existentes, ditou em grande medida a situação a que chegámos.
A lógica política também ajudou: investe-se onde há votantes na esperança de que estes retribuam a “atenção” dos governos. Quem não tem poder eleitoral não conta. O círculo vicioso da pobreza e da desertificação do “interior” vai-se auto-alimentando. Um exemplo bem vivo desta lógica de fazer política foi o encerramento de maternidades e de outros serviços de saúde em diversas regiões do país: encerraram-se serviços com o argumento do insuficiente número de utentes; uma vez encerrados estes e outros serviços, restará às populações abandonadas à sua sorte procurarem esses mesmos serviços nos principais centros urbanos do litoral.
2 - O que pode ser feito para esbater as diferenças entre o Interior e o Litoral?
Uma coisa básica que se pode fazer é assumir o princípio da solidariedade interterritorial, isto é, à semelhança do que os países da União Europeia fazem para com os países economicamente mais frágeis da União, transferir recursos e apoios ao desenvolvimento para estas regiões. Isso faz-se, por exemplo, invertendo a lógica de desqualificação dos serviços e infra-estruturas destes territórios. Faz-se, também e sobretudo, através do reforço da dotação de serviços e da atractividade de alguns centros urbanos do interior, estrategicamente posicionados. Faz-se, por outro lado, olhando para os recursos e capacidades endógenas desses lugares e pensando o respectivo desenvolvimento a partir do aproveitamento desses recursos e competências, ao invés de olhar para eles como desertos ou lugares que, para se desenvolveram, só lhes resta imitar o modelo económico doutros lugares, no nosso caso, do litoral.
3 - Que mais-valias/vantagens poder ter o interior?
Como deixo dito, o interior tem recursos mais ou menos abundantes que podem ser aproveitados e valorizados em matéria de desenvolvimento, desde o património cultural (monumental e imaterial) aos espaços naturais, desde produtos agrícolas singulares aos recursos do subsolo. Nalguns casos, tem até tradição industrial e alguma capacidade financeira associada às remessas da emigração. É a partir daqui que se pode pensar o desenvolvimento. A política de cidades e uma infra-estruturação consequente farão outra parte.
Acresce que hoje em dia, quando a comunicação e o comércio tomam sobretudo o caminho do centro da Europa, estar no interior ou na fronteira não é um elemento penalizador. Pelo contrário, é uma oportunidade de acesso a mercados mais alargados que os locais/regionais, é a vantagem da vizinhança com populações/visitantes potenciais de “fora de portas”. É a oportunidade de ver valorizado em termos económicos territórios menos desordenados e mais preservados na sua autenticidade que outros que, em nome do desenvolvimento, se deixaram descaracterizar.
Évora, 30 de Junho de 2009
J. Cadima Ribeiro
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