Espaço de debate de temas de Economia Portuguesa e de outros que com esta se relacionam, numa perspectiva de desenvolvimento

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segunda-feira, novembro 09, 2020

"Economia do Esquecimento: rasgando o estreito de Magalhães", da autoria de Paulo Reis Mourão

A UMinho Editora publicou o livro "Economia do Esquecimento: rasgando o estreito de Magalhães" na coleção Ciência e Cultura para Todos, da autoria de Paulo Reis Mourão.

https://editora.uminho.pt/pt/Novidades/Paginas/detalhe.aspx?id=114

https://ebooks.uminho.pt/index.php/uminho/catalog/book/12


Da contracapa do livro:

[´Economia do Esquecimento` é um livro que se lê num folgo não tanto por ser contido no número de páginas mas, antes, em razão das temáticas que endereça (desde logo, o desenvolvimento, percebido enquanto acesso das pessoas, nos seus lugares de residência, ao emprego e bem-estar social), da fluidez da escrita e do compromisso que se percebe do autor com a sua região, Trás-os-Montes. Não se tratando de um romance, embora a forma como nos prende à leitura o pudesse sugerir, nem por isso deixa de nele haver espaço para a invocação de paradoxos, heróis e vilões, lamentando-se que não termine com um voto de esperança no futuro.

Embora devesse esperá-lo, acabei amiúde surpreendido pelo enunciar de “realidades” para as quais fui despertado há 40 anos, entre elas as de que “os custos de concentração” (no litoral) devem ser somados aos “custos do esquecimento” (do interior Transmontano, e não só), do que resulta óbvio que a superação ou mitigação de uns e outros só se conseguirá quando as atuações de política olharem, articuladamente, para uns e outros. Endereçando a problemática dos “caminhos do futuro”, concordo com o autor na necessidade dos atores do território se congregarem no estabelecimento de uma “estratégia de desenvolvimento”, ficando-me a dúvida se não devia também ter sublinhado que não há estratégia (de desenvolvimento) sem liderança, singular ou coletiva.

J. Cadima Ribeiro]

quinta-feira, abril 30, 2020

Fórum ´O Turismo no Minho no Pós-Coronavírus`

APROTURM - Associação dos Profissionais de Turismo do Minho

Fórum
O Turismo no Minho no Pós-Coronavírus

Tema
"O Impacto do Emprego e Profissões do Turismo"
(30 de abril de 2020)

0.                Agradeço à Associação dos Profissionais de Turismo do Minho o convite que foi endereçado à UMinho para indicar um seu representante para o debate.
Congratulo-me pelo seu sentido de oportunidade, por trazerem para o debate o tema que foi escolhido.
Saúdo os demais oradores e participantes no Fórum, formulando votos de que se encontrem de boa saúde.

1.                A minha intervenção será centrada em 5 tópicos, para destacar aquelas que me parecem ser as questões/preocupações centrais do momento, e fazer a gestão adequada do tempo me foi atribuído.
Esta intervenção é suportada em reflexão própria e nalguma literatura académica do âmbito do turismo (sobre o impacte da COVID-19), que começa a surgir.

2.                Tópicos selecionados:
i)              Incerteza;
ii)           Insegurança;
iii)         Assimetria;
iv)         Reconfiguração;
v)           Retorno ao caminho.

3.                 Desenvolvimento dos tópicos selecionados
i)                   Incerteza
A crise sanitária, na sua expressão no mundo e implicações de saúde, sociais e económicas, foi um evento absolutamente inesperado e esmagador, comparado nas suas repercussões a tragédias como as da 2ª guerra mundial. Ninguém, indivíduos/famílias, empresas e outras organizações, estado, estava preparado para lidar com tal fenómeno e ninguém sabe muito bem o que se vai passar a seguir, como e quando.
Daí resulta que estamos perante um cenário de gestão de um fenómeno num contexto de aprendizagem e adaptação/resposta. O planeamento, a decisão, o investimento devem acontecer mas guiados por esse ambiente de incerteza, o que recomenda muita prudência, e apostas “seguras”, quer dizer, estruturais.
Dado o contexto e implicações mundiais em que a doença decorre, muitas das respostas necessárias só são possíveis de ser dadas e ter alguma efetividade no contexto internacional global, da saúde, à economia e, obviamente, ao turismo, como é sublinhado por Hall, Scott e Gössling (2020). 

ii)                Insegurança;
A insegurança que se vive começa por ser sanitária, sentida por cada um e pelo coletivo, e conduz a insegurança geral, económica social e turística. Em razão disso, adia-se a retoma da vida económica e social e adiam-se decisões, como a aquisição de certos bens (bens duradouros), o planeamento de viagens e o agendamento de férias. Quando não se adiam, avança-se precariamente, ao sabor dos sentimentos e acontecimentos do dia-a-dia, isto é, por exemplo, fazem-se reservas de alojamento para o verão, mas também se cancelam, a seguir, ao menor sinal de incerteza.
Conforme noticiado nos jornais neste final do mês, depois de no dia 14 de abril António Costa ter dito que espera que, no verão, os portugueses tenham possibilidade de gozar férias, as reservas de casas e hotéis no Algarve têm aumentado. O jornal Observador, por exemplo, avançava que os hotéis algarvios estavam a receber cada vez mais reservas, para julho e agosto, de portugueses e turistas estrangeiros, nomeadamente britânicos (cf. ZAP aeiou, de 27 de abril). Entretanto, o diretor da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve adiantava que “É verdade que também tivemos e ainda temos muitos cancelamentos” (ZAP aeiou, de 27 de abril).
Nesse contexto, o mesmo ator associativo acrescentava nas declarações que fez à comunicação social que “O facto de o Algarve ser considerado um destino turístico Covid-Free pode potenciar o aumento da procura externa” (ZAP aeiou, de 27 de abril).

iii)              Assimetria
O que se refere antes sobre reservas e cancelamentos de férias no Algarve, percebe-se que se passa com outros territórios. Ponte de Lima, por exemplo, é uma das manifestações da assimetria como o fenómeno sanitário, nas suas implicações económicas, se exprime.
O Algarve, ao ser considerado um destino turístico Covid-Free, pode potenciar a procura externa, na medida em que os seus principais concorrentes se debatem com problemas sérios, a começar pelo sul de Espanha, que é um dos seus maiores concorrentes, segundo o diretor da AHETA (ZAP aeiou, de 27 de abril).
Outra manifestação de assimetria neste fenómeno é a do potencial reforço da procura turística interna, em detrimento da externa, não apenas por razões de confiança mas, igualmente, por determinações administrativas que possam existir (barreiras à circulação de pessoas no contexto internacional) e condicionamentos de transporte (operação das companhias áreas, entre outras, que tem sido um dos setores económicos mais atingidos pela crise económico/sanitária).
Conforme enunciado por Gössling, Scott e Hall (2020), a evidência inicial dos impactes nas viagens aéreas, cruzeiros e alojamento foram devastadores. Embora altamente incertas, as projeções iniciais da Organização Mundial do Turismo para 2020 sugerem que as chegadas internacionais podem diminuir de 20 a 30% face a 2019.

iv)              Reconfiguração
Conforme já assinalado, as mudanças no turismo serão desiguais no espaço e no tempo. Nalguns destinos, este quadro económico/sanitário ditará que reconsiderem a natureza da sua indústria do turismo e se concentrem mais em formas locais e mais sustentáveis ​​de turismo (Hall, Scott e Gössling, 2020). Porventura, num primeiro momento, mais atentos ao turismo interno mas com espaço para a continuação da aposta no turismo internacional.
Em todo o caso, este parece ser o momento para questionar a sustentabilidade do percurso mantido, isto é, para equacionar pôr no terreno apostas turísticas menos massificados e que vão ao encontro de públicos mais exigentes em matéria de experiência turística. Trata-se de apostar em transformações menos centradas no crescimento do número de visitantes e, porventura, mais sustentáveis, nas diversas leituras do conceito, e mais ricas e diversas em matéria de fruição turística e de contributo para o desenvolvimento local. O desenvolvimento de nichos como o ecoturismo, o enoturismo, e o turismo criativo, entre outras, são apostas que fazem particular sentido serem feitas em Portugal.

v)                Retorno ao caminho.
Contrariamente ao que acontecia noutros destinos turísticos nacionais, por exemplo, Lisboa, Porto, Algarve e Madeira, o Minho pré-COVID-19 não se tinha ainda tornado num destino massificado. Aparte isso, muita da sua oferta potencial encaixa bem na estratégia que se reclama ser necessário implementar em Portugal no futuro mais próximo e mais longínquo.
As expressões culturais diversas, materiais e imateriais, a natureza, as manifestações particulares do rural, a gastronomia e vinhos, as rotas de peregrinação e de fruição da natureza, etc., são um pano de fundo suficientemente rico e diverso para sustentar um desenvolvimento turístico rico em experiência proporcionada aos visitantes e promotor de desenvolvimento local/regional. A reconfiguração da oferta não parece ser muito difícil de fazer, e as oportunidades económicas avultam.
Não se pense, no entanto, que mesmo no Minho não há custos. Na verdade, do que conheço no terreno, particularmente da vivência de Ponte de Lima, que tinha uma aposta bastante consistente em matéria de atuação no turismo (e era/é, um dos lugares atravessados pelo Caminho [Central)] de Santiago e de outras “peregrinações”, nomeadamente de natureza gastronómica e ambiental), Ponte de Lima, digo, é o exemplo de um local onde foram feitos investimentos que não vão ser rendibilizados e onde há empregos que não serão recuperados no curto e médio prazos.
Note-se a propósito que já antes da crise sanitária e pese o afluxo crescente de visitantes, era para mim óbvio que a oferta de unidades de alojamento local estava a crescer muito acima das necessidades. Criou-se a ilusão de que havia espaço para todos e a rendibilidade gerada era elevada, o que estava longe da realidade. Muitas dessas unidades não vão voltar a abrir, e outro tanto se passa com uma série de pequenos negócios que giravam em torno do turismo.
Esta é uma realidade que estou convencido que extravasa muito o caso de Ponte de Lima, mesmo no contexto do Minho. No caso de outros territórios que viveram mais intensamente o fenómeno da explosão do turismo em Portugal, a situação será muito mais grave.
Seja como for, acredito que há futuro para o turismo em Portugal, e também no Minho, em particular.

J. Cadima Ribeiro
(Professor do Departamento de Economia da EEG/UMinho; investigador do NIPE e do Lab2.PT)


Referências
Gössling, S., Scott, D. e Hall, M. (2020). “Pandemics, tourism and global change: a rapid assessment of COVID-19”. Journal of Sustainable Tourism,
Hall, M., Scott, D. e Gössling, S. (2020). “Pandemics, transformations and tourism: be careful what you wish for”. Tourism Geographies, DOI: 10.1080/14616688.2020.1759131.
ZAP aeiou (2020). “Covid-19 não trava férias de verão. Reservas de casas e hotéis no Algarve aumentam”. ZAP aeiou, edição de 27 de abril de 2020, http://www.aeiou.pt/.

domingo, maio 20, 2012

"...o filme da RTP 2 que passou às duas da madrugada"

«Interessante… para melhor se conhecerem algumas das razões do que se passa neste País

(cortesia de Maria Clara Costa Oliveira)

segunda-feira, fevereiro 06, 2012

Humor...


«Três com pouca sorte.

Um está preso.
O outro está desaparecido.
E o terceiro está com graves dificuldades económicas…»

(reprodução de mensagem que me caiu entretanto na caixa de correio electrónico, reenviada por JBM)

segunda-feira, outubro 03, 2011

Cartas Portuguesas - de Lisboa (VIII)

PARTIDO SOCIALISTA: NOVO CICLO PARA CUMPRIR PORTUGAL? - 11 setembro 2011
[Continua]

Não obstante, Portugal é um pequeno país, com 6% do PIB da União Europeia, mas sem problemas estruturais graves:
• Não tem grandes desertos nem geleiras inacessíveis em seu território, nem muito menos sofre de grandes catástrofes naturais, pelo contrário, é dotado de belezas naturais expressivas que sempre se ofereceram, plácidas, à aristocracia do continente ;
• não tem bolsões de pobreza significativos, numa população pouco superior a dez milhões de almas – nobres - razoavelmente bem distribuídas ao longo do país, tanto em termos de regime de propriedade da terra, como em termos regionais – cada região do país, é mais fascinante do que a outra -, assegurando-se um invejável lugar entre os vinte países com melhor qualidade de vida no mundo inteiro;
• é membro de uma comunidade luso-fônica que corresponde ao quarto idioma mais falado no mundo e um mercado em torno de 250 milhões de consumidores- na qual se destaca um país emergente como Brasil - , toda ela democratizada e sem conflitos de natureza étnica, religiosa ou de intolerância, sobre a qual pontifica como Mãe-Pátria;
• tem ainda uma das melhores e mais irresistíveis gastronomias do mundo, tem azulejos e tem poesia ...

Desculpem-me, portanto, os companheiros do Partido Socialista, em cuja Sede, em 1979, conheci, quando assinei a “Carta de Lisboa” que marcou a reorganização do trabalhismo no Brasil, sob a liderança de Leonel Brizola. Mas o documento aprovado por 75% dos convencionais, ontem, em Braga - “O novo ciclo para cumprir Portugal”- como marco do referido Congresso começa, como diria Maria Aparecida A. Silva no seu poema abaixo transcrito, pecando pela insuficiência do sujeito, que dá nome ao bravo que faz, pela pobreza do verbo, que é Estado – e eu diria Movimento-, e pela ausência do advérbio, de quem vamos precisar:

Aprenda Português! Brinque com a gramática!
(http://pelodesejoeprazerdeescrever.blogspot.com/)

Bendito seja o ensino
Que tira a poeira da mente
Quanto mais a gente estuda
Tanto mais a gente aprende.

Não há divisão de classes
Entre as classes de palavras
Vivem unidas entre si
Umas mansas, outras bravas.

Manso é o artigo
Nem sempre de primeira
Ora define, ora indefine.
Fica sem eira nem beira.

Substantivo?
Este é bravo
Abstrato ou concreto
Comum, próprio, coletivo,
Dá nome ao “ser”, é completo.

O adjetivo exalta, enaltece
Está sempre em atividade
Às vezes machuca,
Sem piedade.

Numeral, agora sim
Acompanha a tecnologia
Está nos computadores
Enche o bolso, esvazia.

Estes pronomes irrequietos
São pessoais, oblíquos e retos
Cerimoniosos, de tratamento
Aconchegantes, bem a contento.

Se há antecedente
O pronome torna-se relativo
Se algo lhe perguntam
ica logo interrogativo.
Demonstrativos, com personalidade
Acompanhando “o ente” são adjetivos
“Denotando-o” são substantivos - barbaridade!

Enclíticos, proclíticos, mesoclíticos,
Átonos ou tônicos
mporta colocá-los no lugar
Para que o todo se torne harmônico.

Advérbio te conheço
De algum modo, tempo ou lugar
Se afirmo, duvido ou nego
É de ti que vou precisar.

Verbo, riqueza da língua
Palavra forte, ação
Sozinho ou acompanhado
É fenômeno, é estado.

Conjunção liga frases
É argamassa na construção
Pode dar sentido ao texto
É coerência, é coesão.

Preposição, que seria de nós
Sem a tua ajuda?
Tu ligas regente e regido
Se te empregamos de qualquer jeito
O sentido muda.

Interjeição é bem “light”
Expressa emoção
Alegria, raiva, dor...
Sai da boca sem preocupação.

Adjetivo, artigo, advérbio, numeral
Substantivo, verbo, preposição, conjunção
Interjeição e pronome são classes de palavras
Umas são mansas, outras são bravas.
Use-as com parcimônia
escubra toda a beleza
De nossa Língua Portuguesa!

Words, words, words..., mas que dizem tudo, muito mais do o mero reconhecimento do documento do PS de que “As palavras estão gastas”.

Paulo Timm

quinta-feira, setembro 29, 2011

Cartas Portuguesas - de Lisboa (VII)

PARTIDO SOCIALISTA: NOVO CICLO PARA CUMPRIR PORTUGAL? - 11 setembro 2011
[Continua]

Vendo-se, entretanto, à distância, a questão do défice público em Portugal percebe-se que nem o PS, nem as forças mais à esquerda, catalisadas por um Partido Comunista extremamente dogmático e arraigado aos velhos dogmas estatizantes do marxismo, detêm uma clara visão sobre a origem da deterioração das contas públicas. Ponto crucial da crise do país, esta questão deveria ser tratada por documentos convincentes a serem apresentados à sociedade, com clara demonstração da evolução do ciclo completo das contas públicas no país: quanto o Estado arrecada, quem paga esta conta, segundo as classes de renda, regiões e atividades, e onde os impostos são gastos, como tudo isto se desenvolveu nos últimos dez anos.
Simples, direto e fartamente documentado algo me diz que o problema não está nos gastos correntes do governo, com custeio de sua máquina ou dos programas sociais, tal como a Troika alega, reverberando a visão da crise feita pelo setor financeiro, mas no custo da própria dívida. É possível até que alguns intelectuais da esquerda o saibam, mas não traduzem o que sabem em documentos oficiais dos Partidos aos quais pertencem. Toda a discussão da crise e do défice público, aqui, vagueia nas nuvens da ideologia, sem âncora nos dados.
Tampouco se vê, aqui – o que de resto acontece no Brasil – uma articulação maior entre os Partidos e a inteligência do país. Assim sendo, a proposta de fixar um limite para o endividamento do país na Constituição, cai no vazio, sem sentido. Como fixar este limite? Em que número? Nos 6% estabelecidos pela Comissão Europeia? Por quê, se no seu interior há países com níveis de desenvolvimento extremamente desiguais e que são obrigados a se utilizar do recurso do défice público para acelerar sua formação de capital fixo e humano como compensação à inflexibilidade da política monetária num regime de moeda única? E como fixar um limite de endividamento quando inexiste uma Lei Ordinária de Responsabilidade Fiscal extensiva às regiões autônomas como a Madeira e municipalidades?
A histórica virada do Partido Socialista português, portanto, se o requalifica junto ao eleitorado para uma volta breve ao poder, nada acrescenta à compreensão da crise no país, nem aponta para uma verdadeira estratégia de consenso nacional em torno das tarefas que aprofundem a democracia interna e a participação da sociedade na busca de soluções desta crise. Aposta em si mesmo, no velho estilo da política tradicional, apesar da retórica renovadora:
(...) buscamos o envolvimento das pessoas. Queremos fazer política com as pessoas e para as pessoas. A participação e o envolvimento das pessoas determinam o êxito das propostas políticas. Só um projecto mobilizador do melhor que há em cada um de nós pode gerar um horizonte de esperança.(...). Queremos fazer política com as pessoas e para as pessoas. A participação e o envolvimento das pessoas determinam o êxito das propostas políticas. Só um projecto mobilizador do melhor que há em cada um de nós pode gerar um horizonte de esperança.
(PS -
http://www.onovociclo.org/wp-content/uploads/2011/06/MocaoONovoCiclo_AntonioJoseSeguro.pdfnovocicloparacumprir Portugal)
Pior, sem apresentar sequer uma convincente plataforma, nem análise aprofundada da crise em Portugal, nem muito menos das projeções ideológicas de sua sociedade. Só princípios gerais, confirmando a tendência à infantilização dos Partidos contemporâneos por todas as partes:
Assim, a acção política do PS é e será definido por três palavras:
Responsabilidade, contribuindo de forma activa para resolver os problemas que enfrentamos, na formação dos consensos que verdadeiramente defendam o interesse nacional e criem condições sustentáveis de melhoria das condições de vida dos portugueses;
Solidariedade, na partilha de sacrifícios aos portugueses e na defesa, também, da equidade entre gerações, como forma de não pôr em causa a coesão social nem comprometer o futuro;
Modernidade, como forma de reforçar a nossa capacidade competitiva, elevando a produtividade do trabalho e criando condições para o aumento sustentável dos salários e do nível de vida das pessoas. (Idem - PS)
[Continua]

Paulo Timm

quarta-feira, setembro 28, 2011

Cartas Portuguesas - de Lisboa (VI)

PARTIDO SOCIALISTA: NOVO CICLO PARA CUMPRIR PORTUGAL? - 11 setembro 2011

Uma das imagens que retive destes dias fora da Europa foi a de grandes manadas de zebras e gnus a atravessar uma estrada num tropel violento, para, poucos minutos a seguir, fazerem com igual convicção e alarido o trajecto exactamente oposto”. (Elisa Ferreira in Jornal Confidencial – Sol , 05 agosto 2011- Portugal)

“Viragem”, aqui em Portugal, é o mesmo que virada, mudança de rumo. Foi isso que aconteceu neste fim de semana na realização do XVIII Congresso do Partido Socialista Portugal, ao qual compareceu o decano Mário Soares, Ex- Presidente da República e figura mais expressiva deste Partido. Comenta-se que há 25 anos não comparecia aos encontros. Por alguma razão apareceu agora. Seria a crise? Ou a crise do próprio PS? Vários outros nomes históricos do PS também estiverem presentes e fizeram contundentes discursos em favor da união do Partido que inicialmente parecia dividir-se entre duas tendências opostas
Portugal atravessa severa crise e o PS, depois de alguns mandatos desde 1976, quando foi aprovada a atual Constituição, acaba de ser apeado do poder por uma coligação conservadora liderada por Pedro Passos Coelho, do PSD. Tratando-se de uma força política poderosa, ideologicamente correspondente, no Brasil, ao PT, embora sem raízes tão fortes no movimento social organizado – sindicatos e outros novos agentes – o PS, num momento de crise no país, procura se revigorar. Para tanto, vira-se à esquerda, substituindo, inclusive, a tradicional mão com a rosa, símbolo da II Internacional, na qual o PDT ocupa honroso lugar, graças ao apoio de Mário Soares a Brizola, pela punho fechado, em sinal de luta. Sem rosas... O tradicional hino do PS também acompanhou a mudança. Tal como Dom Pedro I na Independência do Brasil, o PS apressa-se a ocupar a esquerda antes que “outros o façam”. Mas, mesmo com grandes diferenças internas quanto à forma com que o Partido deve situar-se na conjuntura, permanece na Secretaria-Geral o líder José Seguro. Maria Belém fica na Presidência da agremiação mas, aqui, nos marcos do parlamentarismo, a autoridade efetiva é a do Secretário Geral.
Qual o grande problema do PS português? O Partido esteve seis anos à testa do Governo na pessoa de José Sócrates e só foi derrubado acerca de três meses em virtude do desgaste deste perante a crise. Enfrentou, portanto, os primeiros desafios da crise e chegou, até, a firmar o acordo com a chamada troika européia – COMISSÃO EUROPEIA, FMI e BANCO CENTRAL EUROPEU -, para evitar o desastre em Portugal. A desagregação seria uma consequência da incapacidade do Governo pagar seus títulos em decorrência do défice público, já superior a 100% do PIB, tal como Irlanda e Grécia. O mesmo fantasma que ronda Espanha e Itália. Rigorosamente, a deterioração das contas públicas em Portugal ocorreu justamente no período de governo socialista. Este Partido não teve jamais a coragem de implementar uma ampla Reforma do Estado, capaz de evitar o acumulo dos défices, nem, aliás, detém hoje um plano articulado alternativo ao do Governo. Na oposição, desloca-se para a esquerda como uma típica manobra eleitoral tentando aproximar-se do eleitorado severamente castigado pelo aperto fiscal do Governo. Quem melhor qualifica esta manobra é o Partido Comunista, bastante forte em Portugal. Afirma que a única diferença entre o PS e o PSD é que o primeiro defende o Protocolo de aperto financeiro exigido pela Troika, enquanto o PSD , mais realista do que o rei, o leva um pouco mais adiante. Nada de substancial.
[Continua]

Paulo Timm

sábado, setembro 24, 2011

Cartas Portuguesas - de Lisboa (V)

PORTUGAL, UMA POESIA EM AZUL E BRANCO COM TEMPEROS EXÓTICOS - 09 Setembro
[Continuação]

BRASILEIROS! CONHEÇAM , POIS, PORTUGAL!!!
Aos aposentados, não façam como Frances Mayes. Venham para a Terrinha dos ancestrais, nem que seja por alguns meses do ano. Aqui a vida é barata e muito tranqüila, a comida, como vimos, das melhores do mundo, regada aos melhores vinhos. A tradição poética reverbera no fado e desce pelos azulejos em azul e branco das paredes convidando-o a um passeio celestial. A programação cultural de Lisboa e outras cidades, como Guimarães e Coimbra, invejável. De resto, embora portugueses não acreditem nem apostem muito no filho rebelado e permissivo dos trópicos americanos, o Brasil pode ajudar muito na atual crise do país. O problema crucial do endividamento público aqui, ao contrário do Brasil, é também, reflexo de um grave endividamento externo da economia portuguesa, que corresponde a uns 3% do PIB da União Europeia, que é equivalente ao PIB do Brasil. Pretendem eles, com grande esforço, enfrentar este desafio exportando até 50% da sua economia, o que corresponderia a cerca de US$ 100 bilhões, valor para o qual, tanto um volume maior de exportações do Brasil como o envio de mais brasileiros para cá, poderia contribuir sensivelmente. Ou seja, se o Brasil contribuir com 1% de seu vigoroso PIB de US 1 trilhão, ou US$ 10 bi, para a superação da crise portuguesa, através de um Programa de Cooperação e Assistência Técnica a serem elaborados pela Comissão Permanente do Acordo de Amizade e Cooperação entre Brasil e Portugal, firmado no ano 2.000, terá dado um grande passo na reaproximação entre os dois países, resfriada desde os tempos de Salazar, em razão do persistente colonialismo do ditador na África.
Quanto aos jovens, bom que saibam que o ensino de Portugal é de excelente qualidade e que todos os cursos aqui feitos são reconhecidos no Brasil, graças ao Acordo de Amizade e Cooperação firmado no ano 2000. Além disso, muito baratos, principalmente quando se trata de cursos de pós-graduação, verdadeiramente inacessíveis no Brasil a milhões de formandos em busca de aperfeiçoamento. Outro Acordo, de Saúde, pouco conhecido entre os brasileiros, garante reciprocidade no atendimento de saúde e hospitalar entre brasileiros e portugueses, conhecido como PB4. Nunca foi tão fácil...

Enfim, como preconizavam Gilberto Freire e Darcy Ribeiro, além um velho conhecedor das tradições ibéricas na conformação da modernidade ocidental , Richard Morse (www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo), para não falar do historiador Eric Hobsbawn, hoje fascinado com nossa cultura, a América Latina é o estuário do helenismo, pela via da Peninsula Ibérica, e nela o Brasil tem um lugar especial. Nós somos os herdeiros dos gregos, no culto à liberdade como delírio da razão. O paradoxo em movimento... Olhar para Portugal, pois, não é um truísmo, mas importante elemento de redescoberta das nossas potencialidades já reveladas no nível econômico, mas subjacentes no plano da cultura e do humanismo. É, verdadeiramente, a grande redescoberta do Brasil, desta vez, pelos por nós mesmos...

Paulo Timm

quinta-feira, setembro 22, 2011

Cartas Portuguesas - de Lisboa (IV)

PORTUGAL, UMA POESIA EM AZUL E BRANCO COM TEMPEROS EXÓTICOS - 09 Setembro
[Continuação]

Eis a revelação: Portugal pode não ter tido a sofisticação da corte dos Luises, sob a qual, aliás, um povo faminto morria de fome, indo à Revolução de 1789. Aqui, pode não ter havido baixelas de prata e sofisticados cristais sobre as mesas, mas foi o próprio povo que se sofisticou na arte de comer bem, incorporando na sua cozinha, tal como fez na genética, na arquitetura e na poesia, as sucessivas levas de produtos (azeitona e azeite), temperos ( sopa de coentro com alho picante...?) e pratos (açafrão com figos...?) de suas camadas históricas. Rigorosamente, não há culinária tão variada quanto a portuguesa, resultado tanto das várias contribuições culturais que se juntaram neste pedaço do fim do mundo, como da grande variedade geográfica e climática do antigo e precoce Reino, o primeiro da Europa, fundado em 1139 por D. Afonso, com sede em Guimarães. E onde o mapa não colaborou, a caravela providenciou, trazendo porões carregados de especiarias, de grãos, de açúcar, do mundo inteiro para as cataplanas portuguesas. O que é isto...? Apenas umas grandes frigideiras com tampa, como se fossem ostras a cultivar pérolas preciosas em seu interior... Que outro país faria da mera sopa uma fumegante iguaria? Pois “NÓS TEMOS SOPA”, dizem os portugueses, orgulhosos. Mil e uma receitas das mais estranhas combinações, dentre as quais a mais famosa, a de pão, denominadas açordas e que se tomam de garfo... E há quem diga que no norte fazem uma indescritível sopa de pedra... Não duvido.
Porém, não estará o boa cozinha portuguesa em sofisticados restaurantes. Ela está na mesa dos portugueses de todos os cantos do país e nas tascas rudimentares onde se juntam trabalhadores. E para desvendá-la nos mais mínimos detalhes de sabores e ingredientes, nada melhor do que “A Tradicional Culinária Portuguesa”, de Maria de Lourdes Modesto. Imbatível!

Carlos nos deu o nome de uma tasca. Felizmente, porque sendo tão local talvez jamais nos aventurássemos a entrar só de olhar pelo vão da porta. Com metade do tamanho de uma garagem para um carro apenas... nós nos esprememos em cadeiras numa mesinha minúscula de canto (onde) trazem rapidamente três queijos regionais junto com uma cesta de pães de fazer chorar. Em seguida, nos servem tigelas de sopa de repolho. O português na mesa ao lado nos oferece um pouco do seu javali. Isso nunca me aconteceu em nenhum outro país do mundo. Depois o garçom aparece com uma travessa de estanho com carne de porco grelhada com nacos de alho, coentro e azeite de oliva, acompanhada por um prato de cerâmica com arroz e caldo de feijão. (...) Nós nem sabemos o nome do lugar. É Manuel Zé dos Ossos? O endereço que Carlos nos deu (...) diz Beco do Forno, 12, atrás do Hotel Astoria (Coimbra). Não conseguíamos encontrá-lo e perguntamos a várias pessoas onde ficava a tasca. Todos, inclusive o policial, indicaram o local. Cada mordida é uma satisfação e curtimos a atmosfera de operários e homens de negócios alimentando-se com uma comida robusta.”
(Frances Mayes, in “Um ano de viagens”, da Editora Rocco, 2006, pg. 134)

E se o paladar já era rico em terras lusitanas, o Brasil lhe adoçou o bico, estimulando a invenção de um sem número de guloseimas como os ovos-moles, tortas irresistíveis, misturas paradisíacas de abóbora com amêndoas, o pastel de Belém, o toucinho-do-céu . Ao final, já no século XIX, ofereceu-lhe ainda o café, hoje um dos mais bem servidos e saborosos da Europa, de matar de inveja os franceses.
É José Saramago quem nos guia, hoje, por Portugal (www.citi.pt/cultura/literatura/.../saramago/via_vp1.html), como Eça de Queiros nos guiava no passado entre as “Cidades e as Serras”. Mas temos também, inúmeros guias especializados. Alguns intragáveis. Prefiro, pois, recomendar a leitura de um capítulo sobre Portugal do livro, citado acima, “Um ano de viagens”, de Frances Mayes, Editora Rocco, 2006 , uma americana apaixonada pela Europa, residente na Toscana, autora de outro livro excelente, levado ao cinema: “Sob o céu da Toscana”. Ela se pergunta, aí, sem responder, por que (?) não veio viver em Portugal, tamanho o fascínio que devota à esta terra. Acho que consigo lhe responder. Vejamos:
A Itália tem um imenso encanto próprio, eivado na sua tradição renascentista. Tudo naquele país é belo e magnífico, começando pelas pessoas, seguindo pelos seus vales, até chegar ao mais genital de sua história, no Império Romano. Não por acaso o melhor design do mundo está nos produtos italianos e a capital da moda se mudou de Paris para Milão. Uma colega da Universidade de Brasília , Maria Lucia Maciel, dedicou-se ao assunto e escreveu um memorável livro: O milagre italiano: caos, crise e criatividade (Relume Dumará/Paralelo15,1996). Conclusão: O talento abunda na Itália e se manifesta na sua industria. Foi a Itália, também, a primeira porta de entrada dos americanos na II Guerra Mundial, levando-os ao fascínio com tudo o que viam. Logo após esta Guerra, a Itália viria a vivenciar seu grande milagre econômico, chegando a converter-se numa das grandes economias européias, hoje, com 18% de seu Produto Interno. Juntando-se o espetáculo industrial com a tradição das artes e a beleza dos cenários naturais e criados, como a Toscana, a Itália acabaria seduzindo a América do Norte desertando-a de Paris. Hemingway é um bom exemplo disso, tendo ele próprio escrito “Paris é uma festa”, no início de século XX - e lá se convertido em grande escritor- , volta seus olhos para a Itália onde escreve, depois da II Guerra, outro belo romance, pouco conhecido – “Do outro lado do rio, entre as árvores” , 1950, Ed. Bertrand, Brasil- no qual revela o enlevo de um coronel americano por uma jovem e encantadora princesa italiana. A Pax Americana, em ascensão, dobrava-se à milenar Pax Romana... E lá se foi a nossa grande escritora Frances Mayes dormir seu sono de donzela na Toscana e não no Algarve.
Enquanto isto, Espanha e Portugal, que poderiam ter disputado com a Itália o esplendor do pós-guerra, continuaram mergulhados em ditaduras anacrônicas do pré-Gerra. Quando delas despertaram, na década de 70, foram engolfados pela globalização que, na Europa, atende pelo nome de União Européia, uma difícil iniciativa de nações com culturas e níveis de desenvolvimento completamente diferentes, para se contrapor a outros poderosos blocos do mercado internacional.
Portugal, entretanto, mesmo integrado à modernidade mantém seus traços provincianos de valorização da dignidade humana, presentes na qualidade de vida de seus concidadãos combinado com as aquisições de bem-estar social da Constituição de 02 de Abril de 1976, emanada da Revolução dos Cravos, de 25 de Abril de 1974. Isto lhe garante um honorável posto entre os 20 países com melhor qualidade de vida no mundo.
[Continua]

Paulo Timm

segunda-feira, setembro 19, 2011

Cartas Portuguesas - de Lisboa (III)

PORTUGAL, UMA POESIA EM AZUL E BRANCO COM TEMPEROS EXÓTICOS - 09 Setembro
[Continuação]

Portugal é um país pequeno na extremidade ibérica, povoado, sucessivamente, por inúmeros povos em suas andanças à procura do Fim do Mundo, desde tempos imemoriais. Estou falando de neandertais e cromagnons que deitaram aqui seus vestígios por toda parte – guardados com carinho no Museu Arqueológico Martins Sarmento, em Guimarães, berço da Pátria portuguesa. Outro sítio, celta – Citânia de Briteiros- também está nesta cidade. A eles se sucederam, no curso de séculos vários outros povos, dando a esta parte da Europa um caráter de esquina do mundo, sobre a qual se debruçaram, como numa sacada, ansiando pelo mar oceano. Finisterra, para o homem – primitivo, clássico, medieval - inquieto em seu andar, sempre à cata de novas paragens. Começo da geografia continental para os modernos que atravessam o Atlântico, nos dias de hoje. Borda da história, como um acontecimento...Fato e fado, este não por acaso o evocativo musical do país, intercalando-se a cada passo.
Com efeito, aqui, mais do que em qualquer outro lugar, o tempo é a medida da eternidade sem compasso; o homem esta eternidade em seus passos. Portugal guarda consigo esse mistério como uma esfinge metafórica postada no umbral do infinito a clamar: Decifra-me! Seu canto dilacera os corações pasmando até mesmo ouvintes que nada entendem da letra. A só música basta e corta. A palavra saudade brota lapidada pela exclusividade do sofrimento português, como nenhuma outra, em qualquer idioma:

Oh águas do mar salgadas,
De onde lhes vem tanto sal.
Vem das lágrimas choradas
Nas praias de Portugal
(António Oliveira Ferreira, poeta português)

Um tão grande sofrimento teria que se refrescar em alegorias. Aqui elas estão por muitas partes, mas se sintetizam no azul e branco dos azulejos que percorrem ruas inteiras de várias cidades, pátios mediterrâneos e fachadas de muitos casarões ao largo do país e os interiores das “casinhas”. Como gostam dos diminutivos! E como eles se casam alegremente com os azulejos! Meu pequeno apartamento, em Covilhã, aqui é uma “casinha” e se alia à tradição. Abre-se diretamente no que poderia ser um mero corredor que distribui para os quartos, a cozinha, a sala e o banheiro, mas, lusitano, alarga-se como uma ante-sala mais ampla só para estampar seus azulejos. Olho embevecido - que maravilha! O azul e o branco como que nos trazem um pouco do céu ao alcance das mãos. Têm o mesmo efeito simbólico que as curvas de Oscar Niemeyer que viriam a sepultar as pesadas colunas enlaçando num mesmo gesto edificante os ares e o solo da modernidade. Os azulejos, enfim, estão para Portugal, como os tapetes para o Irão e como os frescos para o Renascimento e as curvas para Niemeyer.
E há a poesia, que, aliás, dá-se, aqui, como o próprio tempo. Ela está na confirmação da língua portuguesa, com Camões, secundando Homero na épica lusitana. Darcy Ribeiro retirou daí a convicção de que somos os herdeiros mais legítimos do helenismo: mistura de gentes, paixões dionisíacas à solta, o mar como fronteira e cinzel da razão, a criação poética como fundamento da filosofia. O caleidoscópio civilizatório. Noel Rosa que o diga ao assinalar a poesia como parte do cotidiano do morro brasileiro:

Fazer poema lá na Vila é um brinquedo
Ao som do samba dança até o arvoredo

A poesia atravessa toda a história de Portugal, vincando a prosa de Fernando Pessoa como se fossem versos:

Que há (de alguém) confessar que valha ou que sirva?
O que nos sucedeu, ou sucedeu a toda a gente ou só a nós;
num caso não é novidade, e no outro não é de compreender.
Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de
sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem
importância. Faço paisagens com o que sinto. Faço férias das
sensações. Compreendo bem as bordadoras por mágoa e as
que fazem meia porque há vida. Minha tia velha fazia paciências
durante o infinito do serão. Estas confissões de sentir
são paciências minhas. Não as interpreto, como quem
usasse cartas para saber o destino. Não as ausculto, porque
nas paciências as cartas não têm propriamente valia. Desenrolo-
me como uma meada multicolor, ou faço comigo figuras
de cordel, como as que se tecem nas mãos espetadas e se
passam de umas crianças para as outras. Cuido só de que o
polegar não falhe o laço que lhe compete. Depois viro a mão
e a imagem fica diferente. E recomeço.
( F.Pessoa – Livro do Desassossego , pg. 45)

Assim, entre azulejos e versos, que inspiram a alma, chega-se à cozinha. Haverá algo mais sublime na civilização do que este corte entre o cru e o cozido? Estudos recentes, intuídos por Levy Strauss, um dos pais da Antropologia Moderna, demonstram que neste entre-acto, assim mesmo, cerimoniosamente, esteve o elo perdido entre o humano e seu ancestral. O levar o alimento ao fogo teve o mesmo sentido do pintar-se o corpo na busca de uma identidade. Uma diferenciação. Já não mais a coleta ou o devoramento instintivo das caças. Mas a mediação: o intervalo da consciência entre o apetite voraz e o desejo. Depois veio a mesa, como uma das mais decisivas instituições do Império Romano. “Ainda ensinaremos estes bárbaros a se banharem e a sentarem-se à mesa”, proclamavam os generais romanos em suas refregas pela conquista do mundo então conhecido... Séculos depois, restou aos europeus, aprendida a lição da mesa, sofisticar os pratos e inventar os talheres, tais como hoje os usamos. Tudo para que os americanos acabassem eclipsando estes saltos civilizatórios com a invenção dos fast-food... Mas quanta saudade da “Festa de Babete”...
[Continua]

Paulo Timm

domingo, setembro 18, 2011

Cartas Portuguesas - de Lisboa (II)

PORTUGAL, UMA POESIA EM AZUL E BRANCO COM TEMPEROS EXÓTICOS - 09 Setembro

Com o perdão de meus afilhados de casamento J.C. e M., que passaram, recentemente, sua lua de mel em algum recanto paradisíaco do Caribe, não consigo entender o quê brasileiros vão fazer naquela parte do mundo quando têm, a seus pés, a mansidão de infindáveis praias do Nordeste, verdadeiras maravilhas no cerrado, particularmente em Bonito –MT , a pujança dos hotéis no meio da Amazônia e uma nação inteira para visitar no extremo sul, com sua variedade geográfica, étnica e cultural. Para não falar em Portugal... Aliás, a propósito, vou falar sim!
Já havia estado em Portugal por duas vezes.
A primeira, ao encontro de Leonel Brizola, em 1979, atendendo sua convocação para a reorganização do trabalhismo no Brasil que resultou na assinatura da histórica Carta de Lisboa, ao cabo de vários dias de reuniões na Sede do Partido Socialista, no Largo do Rato, graças ao apoio de Mario Soares. Na época varei Lisboa de ponta a ponta e, graças à generosidade de um velho político brasileiro, Hugo Borghi, lá presente, senhor de muitos prósperos negócios, que se fez meu amigo, conheci o que de melhor há na suculenta cozinha portuguesa.
Depois, no ano 2000, aqui estive a passeio, novamente e, no itinerário até Fátima, deliciei-me com a bela paisagem ao longo da estrada.
Agora venho com mais calma, para uma estada de dois anos. Cheguei à Lisboa na manhã do dia 30 de Agosto de forma a poder desfrutar, ainda, o último mês do verão europeu. Depois, sei que vou sofrer/ não sei a hora...Sou friorento. Saio rápido do Aeroporto, carregado de malas e procuro a Rota A-23. Meu destino é Covilhã, ao nordeste do país, fronteira com Espanha, a 220 km de Lisboa, onde chego um pouco cansado, perto do meio dia e me ponho a saborear o famoso queijo de ovelhas (aqui dizem ubelhas) da Serra da Estrela, com um bom vinho, ambos recomendados pelo meu amigo Paulo Roberto Pegas, de Torres, no Rio Grande do Sul. Aleluia!
Não me deterei, hoje, sobre a bela Covilhã serrana. Haverá tempo. E até quero conhecê-la mais para poder dizer-lhe melhor sobre encantos e propriedades. Registro, ainda, que não resisti à tentação (lembro-me sempre da máxima de Oscar Wilde: Só os fracos resistem à tentação) de conhecer logo Salamanca – velho sonho -, a 180 km de onde estou. Sobre este portentoso monumento da Idade Média também reservarei outro dia. Hoje é Portugal. Impressões, leituras, informações. E o apelo aos concidadãos brasileiros: Visitem a Mãe-Pátria! Aqui não encontrarão nenhuma resposta, que, de resto, soem ser vãs ilusões, mas ampliarão horizontes que lhes permitirão entender as origens culturais – Minha pátria é minha língua, como dizia o grande poeta Fernando Pessoa - , conhecer o passado comum mergulhado na romanização da Europa e no medievalismo da cristiana idade, e ainda saborear as delícias de uma das melhores cozinhas do mundo.
(Continua)

Paulo Timm

sexta-feira, setembro 16, 2011

Cartas portuguesas - de Lisboa

A Crise portuguesa - 02 setembro 2011

A crise mostra suas garras e colhe os portugueses de surpresa nas armadilhas da globalização financeira. Quanto ao Brasil, nossa relação distante limita-se à presença de alguns artistas e novelas da Globo.

Voltar às origens, esta é a sensação de estar em Portugal, para onde retorno depois de dez anos, desta vez para uma longa estada de estudos. Quero ver a crise europeia de perto... Por todos os lados, um pouco de nós mesmos: no falar, na arquitetura, nos monumentos que enaltecem o périplo marítimo que marcou o segundo milênio da nossa Era Cristã fundindo nossas histórias por três séculos. A cada café parece-me encontrar em alguém o rosto meu velho avô Affonso Pereira, neto de portugueses, morto nos idos de 50, quando eu era ainda criança, mas com a suficiente lembrança de seus hábitos morigerados, rosto fino e alongado sobre o qual se lhe via um topete branco, sempre impecavelmente vestido.

Aliás, não há um tipo físico típico de português, embora o associemos ao estilo ‘galego”, baixo, atarracado, mais próprio dos trasmontanos do norte do país, a região mais pobre de Portugal, de onde saíram os milhares de patrícios que foram para o Brasil no século passado. Nas ruas veem-se loiros, morenos, baixos atarracados, longilíneos, homens e mulheres de tipo mignon, alguns poucos negros e mulatos, gente de todo tipo, porque, já na época do descobrimento, a precoce nação, nascida em 1385, já era extremamente miscigenada.

Mas Portugal é também muito diferente do Brasil. Gostaríamos, aliás, que fosse mais ligado ao Brasil. Sua incorporação à União Europeia, entretanto, sepultou esse sonho. Hoje, a Finisterra dos tempos clássicos, para onde refluíram e se instalaram fenícios, gregos, cartagineses e, finalmente, os romanos, senhores dos mares da antiguidade, na sua ânsia de conhecer e dominar o mundo, além dos árabes, na Idade Média, é apenas um pequeno elo de uma globalização intercalada pela formação de blocos.

Centro colonial de um vasto império que, depois das Grandes Navegações, no século XVI, ia da América à Ásia, passando pela África, Portugal selou seu destino no início do Século XVIII ao ter que se subordinar ao poder militar da Inglaterra, que acabará salvando sua família real um século depois, ao retirá-la para o Brasil, a salvo da invasão napoleônica. Sem uma “invencível armada” restou-lhe contemplar passivamente a Pax Inglesa que vigorou até o final da I Grande Guerra, mergulhando aí num obscurantismo colonial à outrance, na África, mantido a ferro e fogo internamente por um regime retrógrado que subsistiu até a Revolução dos Cravos, em 1979.

Ao abrir-se, então, para a democracia, o histórico país confrontou-se com uma nova realidade mundial marcada, na Europa, pela criação da União Europeia, onde iria ocupar um papel marginal em virtude da pequena envergadura de seu mercado e baixa produtividade de sua indústria. Vastas áreas do país foram transformadas em reflorestamentos enquanto as cidades reduzem-se a um papel secundário como prestadoras de serviços, hoje responsáveis por 67,8% do PIB.

Não obstante, tanto a tradicional agricultura, produtora de grãos e frutas modernizou-se, ocupando embora 12% da população ativa, como a indústria mais pesada também avançou no país, vindo a alcançar perto de 30% do valor agregado da economia, graças a grandes plantas automobilísticas e petroquímicas aqui sediadas nos últimos lustros. Em vista disso, europeizando-se e se desenvolvendo, mesmo como apêndice econômico da UE, Portugal foi se distanciando cada vez mais de seu filho promissor, o Brasil.

Décadas de congelamento das relações diplomática entre os dois países, à raiz da insistência do colonialismo português na África, anteciparam o atual isolamento, hoje reduzido à Comunidade Lusofônica, algumas novelas da Globo e uma que outra presença de cantores famosos. Lembre-se que foi o Brasil, mesmo sob regime militar, mas graças à antevisão do chanceler Azeredo da Silveira, o primeiro país a reconhecer tanto Angola como Moçambique, logo da proclamação da Independência desses países.

“Com o fim da escravidão, Brasil e Angola viveram um período de afastamento que só foi alterado com o início dos movimentos de independência angolanos. Durante esse período, grandes nomes da Diplomacia brasileira, tais como Gibson Barboza e Azeredo da Silveira, se mostraram preponderantes na defesa da importância do restabelecimento de relações mais próximas com o continente africano, e com Angola em especial, e trabalharam no sentido de romper com o tradicional alinhamento a Portugal no caso das colônias africanas. Essa mudança de posição levou o Brasil a ser o primeiro país a reconhecer aindependência de Angola, o que foi um fator determinante para as relações exteriores brasileiras. A decisão brasileira não só aproximou enormemente os dois países como modificou e fortaleceu aimagem do Brasil no exterior, principalmente entre os países ditos periféricos” Suhayla Mohamed Khalil Viana in A posição brasileira diante da independência angolana: antecedentes e desdobramentos).

Hoje, enfim, mudaram os tempos, mas nos fizemos, para os portugueses, apenas uma longínqua referência lusofônica. Agora, porém, a crise mostra suas garras e colhe os portugueses de surpresa nas armadilhas da globalização financeira. O país é, do ponto de vista geral, muito parecido com o Rio Grande do Sul, com uma grande diversidade geográfica assinalada por Eça de Queiroz em A Cidade e as Serras, um vasto e prazeroso litoral que deliciava as cortes europeias nos invernos dos séculos XVIII e XIX, uma população aferida no Censo de 2011 de 10. 555. 583[4] habitantes, com uma renda per capita de US$ 22026USD[6] , perfazendo um PIB, em 2009, na ordem de US$ 233,4 bilhões*[5] (34.º), relativamente pequeno, mas suficiente para tornar a qualidade de vida em Portugal uma das 20 melhores do mundo:

Indicadores sociais :
- Gini (2009) 33.7[7] – médio
- IDH (2010) 0,795[8] (40.º) – muito elevado
- Esper. de vida 78,1 anos (39.º)
- Mort. infantil 3,3/mil nasc. (26.º)
- Alfabetização 94,9% (68.º)

Sobre esse pano de fundo é que se abate a atual crise em Portugal, exigindo do governo conservador medidas de saneamento verdadeiramente assustadoras. O desemprego é superior 12%, o endividamento público, superior a 100% do PIB com uma variação na taxa de juros média nos últimos três meses de 16,6% - uma das mais altas do mundo - e o risco (CDS) também elevado, de 640 pontos base, quando Espanha está com 240 pontos, Itália com 146 e Alemanha, o gigante europeu, com 37 pontos.
Todos, aqui, com exceção dos detentores de grandes patrimônios estão, como dizem, “a pagar a conta” da crise. Na quarta-feira passada o governo anunciou a sobrecarga de um adicional do imposto de renda, por dois anos, sobre as empresas com lucro superior a 1,5 bilhão de euros, bem como sobre as pessoas com rendimento superior a 3,4 euros mensais, algo próximo a oito mil reais, agravando a situação da classe média. O próprio governo reitera, entretanto, que tais medidas não pretendem taxar o capital nem inibir eventuais investidores, debitando-se mais ao esforço de socializar os custos sociais da superação da crise do que a qualquer argumento ideológico.

O grande problema da crise, porém, não se resume a países isolados. Todos os especialistas são unânimes em reconhecer que os recursos estritamente europeus para enfrentar a crise de endividamento público que ameaça a estabilidade dos mercados em toda a zona do Euro são insuficientes. Na primeira semana de setembro, José Manuel Durão Barroso, o chairman da União Europeia enviou uma carta a todos os líderes do bloco na qual apela para uma “reavalição urgente... (dos fundos) para aguentar os riscos do contágio da dívida.” Mas Angela Merkel, da Alemanha, ainda se esforça para segurar a escalada dos juros e da crise na Espanha e Itália, acreditando poder, com isto evitar o efeito dominó sobre todo o continente.

A urgência solicitada por Durão Barroso, porém, faz sentido. A União Europeia dispõe, hoje de 500 bilhões de euros para as emergências, sendo 440 bilhões do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF) e 60 bilhões do Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira. Deste montante, 170 bilhões já foram alocados em ajudas à Grécia, Irlanda e, agora, Portugal. Sobram apenas 320 bilhões até 2013, quando o Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira passará a ter um acréscimo orçamentário para 750 bilhões de euros.

Mas, segundo estimativas do Deutsch Bank, um socorro eventual à Espanha custaria 300 bilhões e outro, à Itália, não ficaria por menos de 490 bilhões.

Estes dois pesos pesados da economia europeia representam, respectivamente, 12% e 18% do PIB da zona do euro, quando os atendidos até agora , Grécia + Irlanda + Portugal, não passam, juntos, de 6% desse total. A crise do euro, portanto, ainda está muito longe de ser devidamente avaliada e muito mais longe ainda de ser superada.

Paulo Timm

segunda-feira, janeiro 31, 2011

O Poder Real em Portugal 2010 e a Crise (11ª parte)

[Continuação]
Em jeito de CONCLUSÕES
[...]
10 - Em qualquer situação uma das maiores tarefas cívicas a realizar, para minorar a miséria dos mais desfavorecidos, será o reforço das “Instituições de Solidariedade Social” (não a pseudo-“Justiça Social” exigida pelos bolcheviques do PCP e do BE, que destroem as pequenas e médias empresas e impedem outras de se formar, porque, entre outros aspectos, obrigam à manutenção de leis laborais tais que, se a gerência de uma empresa, por falta de liquidez pontual em caixa, não pode pagar aos empregados até ao dia 10 do mês seguinte, o(a) “polícia” sindicalista, sempre presente, a “conselho” do seu Sindicato, usa a lei laboral actual para, de imediato, “manietar” a gerência, levando a empresa à falência. E daí nada resulta que não seja desemprego, pois, por regra, as vendas dos recheios das empresas não chegam para pagar às Finanças, à Segurança Social à Administração da falência e as custas aos tribunais...
11 - A redução do “wellfare state”
Por razões várias, bem documentadas nos meios de comunicação nacionais e europeus, o tradicional “wellfare state” (Segurança Social) prevalecente na Europa na última metade do século XX (e também em Portugal no último quartel), com tudo gratuito (Educação, Saúde, etc.), 30 ou menos horas de trabalho por semana de 5 dias, reformas por inteiro garantidas aos 55 anos, com pagamento de 15 ordenados por ano (16 meses na falida Grécia), tornou-se insustentável. Daí uma das principais razões das gigantescas Dívidas Públicas da Grécia, de Portugal, onde os “trabalhadores” têm direito a acréscimos que vão até 200% no valor das horas “extraordinárias” que façam, ao contrário do que sucede numa Suíça ou numa Alemanha, da Espanha, da Irlanda, da Islândia, da Itália e da própria França e Reino Unido.
Naturalmente que países da zona euro, como a Alemanha, que têm pago a “factura” destas grandes “dissonâncias” entre o “wellfare state” usado em sua casa e o “wellfare state” que os (des)governos do Sul da Europa resolveram implementar, exigem que haja critérios comuns quanto aos direitos (e deveres) dos “trabalhadores” em toda a Europa, de modo que as despesas com a Segurança Social se tornem sustentáveis. Esta exigência tem levado a um clamor imenso em Portugal e noutros países. Porém, tal gritaria nada resolve: as leis económicas não são menos inflexíveis que a lei da gravidade...

Braga, Jan. de 2011
JBM

Referências
http://hugolancassocial.blogspot.com/2007/10/constituio-da-repblica-portuguesa-e-as.html
-José M. Barroso, “O 'mistério' do 25 de Novembro de 1975”, Diário de Notícias, Lisboa
21-11-2006.
Varqá Carlos Jalali, “The Evolution of the Portuguese Party System in Comparative European Perspective since 1974”, Ph.D. Thesis, University of Oxford, 2002
Wikipedia.

(Artigo de opinião/testemunho do autor identificado. Devido à extensão total do texto, que se reporta a um período amplo e a dimensões muito variadas da realidade que trata, será divulgado por partes. Sendo matéria sensível aquela que se invoca, é aqui tratada como testemunho de alguém que viveu o período objecto de análise e que dele faz a sua leitura.)

domingo, janeiro 30, 2011

O Poder Real em Portugal 2010 e a Crise (10ª parte)

[Continuação]
Em jeito de CONCLUSÕES
[...]
8 - O desemprego é hoje em Portugal uma das maiores chagas. E trata-se de um “círculo vicioso”: o desempregado não produz, por isso não contribui para o PIB; consome menos, (mas tem de consumir) e por isso a sua procura de bens e serviços baixa, o que também contribui para baixar o PIB; vive sob a forma de “subsídio-dependência”. Como resolver a questão sem aumentar o Défice e a Dívida Pública? Pôr o desempregado a trabalhar por alguma forma. Por ex., são milhares de milhões de euros os custos das destruições causadas pelos dos incêndios em cada ano. Há que usar os desempregados (mesmo que sejam “dr.s”) para limpar as florestas no Inverno e na Primavera e pô-los como vigilantes no Verão. (E o Governo tem formas aceitáveis de o fazer, mesmo sem ter de “nacionalizar” os terrenos. Já foram publicitadas na imprensa em anos passados, e os governos pouco ou nada fizeram a esse respeito). Ora tais acções também aumentam e muito o PIB. Mais, a Itália, nas décadas de 70 a 90, também se debateu com elevados custos de “subsídios de desemprego”. O governo italiano de então tomou uma decisão inteligente: fez acordos com empresas de Construção Civil e Obras Públicas italianas para concorrerem a preços bastante baixos ou nulos a obras em países africanos, como Moçambique, devendo essas empresas levarem para essas obras desempregados italianos e estes só tinham como opção irem ou perderem os subsídios de desemprego. Ao mesmo tempo, o governo italiano obtinha, como compensação, o arrendamento por preço praticamente nulo e por muitos anos de terras e/ou de empresas em Moçambique, onde instalou muitos outros desempregados. Formas semelhantes usaram os holandeses e até os suecos. Também os japoneses usaram essa metodologia para colocarem no Brasil centenas de milhares de japoneses desempregados.
(Observa-se que é errado, como vem sendo dito nos órgãos de comunicação social, supor que os desequilíbrios nas contas externas de um país são devidos apenas a desequilíbrios na balança de “Importações – Exportações” de mercadorias. Os desequilíbrios nas contas externas de um país derivam de desequilíbrios na Balança de Pagamentos e as remessas dos emigrantes contribuem para equilibrar essa balança.)
Outra forma de diminuir o desemprego é “reconverter” os desempregados, mesmo aqueles que se aproximam dos 50 anos de idade. Há que reconverter essa gente dando-lhe “formação” apropriada em laboratórios e estágios em empresas e/ou serviços públicos dirigida para profissões com saídas em Portugal, em África, Brasil, etc.. Todas essa acções contribuirão para o aumento do PIB. Por outro lado, um número apreciável de desempregados são jovens com cursos superiores que escolheram o curso sem terem em consideração as “saídas profissionais” ( ou com cursos superiores incompletos, que abandonaram pelas mais variadas razões). Hoje, o Ensino Superior oferece mais de 5000 cursos superiores sem dar aos candidatos indicações sobre as “saídas profissionais” para cada curso. Há também que reconverter esta gente dando-lhe “formação” para profissões com saídas em Portugal e fora dele, conforme acima se indicou
Ainda outra forma de diminuir o desemprego é orientar os desempregados para pequenos negócios, com recurso ao micro-crédito que o Governo deve fomentar pressionando os bancos nesse sentido (veja-se as acções de Muhammad Yunus na Índia e Bangladesh).
(As escolas de todos os níveis em Portugal não promovem de forma alguma o “espírito de empresa”, até porque não existe a disciplina de Economia no Secundário e, lamentavelmente, até desapareceu nos cursos de Engenharia...).
9 - Ao contrário do que é público e do que é publicado, os estabelecimentos de ensino público, cooperativo e privado, bem como os hospitais públicos, em parceria ou privados, e alguns serviços camarários, são “unidades de produção” cujo rendimento é possível contabilizar a curto ou a médio prazo, e não apenas unidades com “despesas sem retorno”. De facto, uma escola prepara (ou deve preparar) jovens para as mais variadas actividades produtivas (as Letras e as Artes também são actividades produtivas, mesmo em sentido económico) e os responsáveis do Ensino em todos os níveis não devem perder isso de vista. Assim, todas as escolas contribuem para o PIB a médio prazo. Um hospital não é mais que uma “oficina” de “reparação ou nascimento” de seres humanos. E, na medida em que execute a sua missão com eficiência e rapidez, também contribui para o PIB a curto prazo. O serviços camarários de Obras Publicas, de Transportes, de Sanidade e Limpeza, de Tráfego, de Jardinagem, etc. também contribuem para o PIB a curto e a médio prazo, na medida que executem a suas missões com eficiência e rapidez.
O facto é que a grande maioria dessas entidades em Portugal, sendo públicas, executam tarde, mal e deficientemente os “serviços à comunidade” para os quais foram concebidas. Por ex.: é impossível marcar por telefone uma consulta de qualquer especialidade num qualquer hospital público. Indo pessoalmente ao hospital com uma requisição de um médico de família, a consulta será marcada sempre para daí a meses, em geral muitos. Porém, num hospital de parceria público-privada é possível marcar por telefone uma consulta de qualquer especialidade para daí a uma ou duas semanas, em geral o máximo de um mês. Marcada que seja a consulta num hospital público com dia hora e local, o doente, cumprindo o horário, terá de esperar horas, por vezes muitas, para ser atendido. Marcada com dia hora e local a consulta num hospital de parceria público-privada, o doente cumprindo o horário, terá de esperar minutos, não muitos, para ser atendido. Estes são os factos. Porém, dada a situação de crise, diz-se por todo o lado que é preciso acabar com as parcerias público-privadas porque são a principal causa dos défices anuais e, consequentemente, da Dívida Pública acumulada. Ora, o que parece acontecer é que o Estado negociou, em geral, muito mal as parcerias público-privadas e porquê? Essencialmente, o Estado, quando faz um contrato de parceria público-privada, por ex. para um hospital, faz o contrato na base de um “programa com termos de referência” para “para construção, equipamento, manutenção e funcionamento” do hospital, prevendo-se um conjunto de “actos médicos” (consultas, etc.), outro conjunto de “actos enfermagem”, outro conjunto de operações cirúrgicas de várias especialidades, outro conjunto de doentes-dias de internamento, etc., etc., acções de muito difícil contabilização e controlo quanto a pagamentos, começando pelos custos da construção e de manutenção das instalações e dos equipamentos, os quais são superiores aos custos da construção e da manutenção das instalações, não havendo PROJECTO OFICIAL (de Engenharia Civil, Mecânica e Electrotécnica) para a construção e manutenção das instalações. Portanto, os interlocutores do Estado não estão em condições de fazer um bom ou mesmo um razoável negócio. E, em parte, já vimos acima o que acontece. Mas, como o Estado Português não tem fundos para financiar a construção e equipamento de raiz de hospitais públicos, nem sabe organizá-los eficientemente, para garantir serviços de saúde condignos aos cidadãos, terá de, se quer atingir este objectivo, continuar a celebrar contractos de parcerias público-privadas. Só que, com base na experiência passada, terá aprender a fazer o negócio, começando por, previamente mandar fazer, de sua conta o PROJECTO OFICIAL das obras e sua manutenção, na base do qual lançará depois o concurso para construção, equipamento, manutenção e funcionamento do hospital.
Os exemplos de serviços camarários lentos, deficientes e ineficientes, também abundam, com elevado prejuízos, contabilizáveis, para o PIB. Um ex.: numa câmara municipal, um munícipe, que até é especialista no assunto, demonstra por A+B que o circuito de tráfego actual numa rua de traçado em U conduz a engarrafamentos e danos nos veículos circulantes e estacionados, essencialmente por causa de a rua ter sentido duplo. Apresenta sugestão escrita e fundamentada para que a câmara instale sentido único na rua em causa (o que quase nada custa aos cofres da câmara) no “Gabinete de Apoio ao Munícipe”. Passam-se 6 meses sem resposta. Repete o pedido. Passa-se mais 1 ano sem resposta. O munícipe vai à assembleia municipal e nos minutos destinados ao Público, no fim da sessão, expõe o problema e apresenta directamente ao presidente da câmara cópia da documentação. O presidente da câmara promete mandar um engenheiro dos serviços respectivos convocar o munícipe para uma reunião de discussão do assunto. Passa-se mais outro ano sem qualquer convocatória...
Outro caso: numa estrada normal dentro da área urbana de outra câmara municipal, próximo de um cruzamento onde se têm registado vítimas por excesso de velocidade dos veículos que ali circulam, os donos da casa que está sobre o cruzamento apresentam, com apoio da junta de freguesia, pedido escrito e fundamentado para que seja construída uma rotunda no cruzamento em causa, para que os veículos sejam obrigado a reduzir a velocidade ao entrarem na rotunda. Face à falta de resposta da câmara, os munícipes interessados vão à assembleia municipal e nos minutos destinados ao Público, no fim da sessão, expõem o problema e apresentam directamente ao presidente da câmara cópia da documentação. O presidente da câmara promete mandar um engenheiro dos serviços respectivos convocar os munícipes e a junta de freguesia para uma reunião de discussão do assunto. Passa-se mais de um ano sem qualquer convocatória...
Depois destes exemplos, nem dá para se apresentarem vários casos de deficiência e ineficiência de serviços, tais como os da CP (Caminhos de Ferro Portugueses), um dos maiores “sorvedoiros dos dinheiros públicos”, que está dividida em vários sectores, cada um com o seu “Director” (comboios suburbanos, comboios regionais e comboios de longo curso), com bilheteiras lado a lado mas que “não falam nem comunicam entre si” (na falta do funcionário numa das bilheteira, outro doutra bilheteira não poder vender bilhete nem substituir o colega!), com gabinetes dos vários quadros superiores separados e luxuosos, centrados em Lisboa, não falando uns com os outros e passando o tempo a reenviar o utente de sector para sector. E nem adianta criar um blogue onde se mostra a necessidade e possibilidade de fazer horários mais úteis às centenas de utentes que dia a dia se têm de deslocar para o seu serviço. Nem com a intervenção de jornalistas que constatam in loco e publicitam as deficiências e imobilidade , se demove a manutensão da rotina dos serviços de empresas públicas ou em grupo, como a CP, que, ao contrário de qualquer grupo de bancos, nem sequer tem serviços integrados de contabilidade e outros (os computadores da CP, às vezes instalados lado a lado, não “falam” uns com os outros!...)
Já nem se fala na REFER e na RAVE (Rede de Alta Velocidade), há anos existente sem existir a dita Alta Velocidade (TGV)...Está tudo tranquilo e imóvel porque o contribuinte paga todos os prejuízos e os OGEs e a Dívida Pública tudo cobriram. Até quando?
[Continua]

JBM

(Artigo de opinião/testemunho do autor identificado. Devido à extensão total do texto, que se reporta a um período amplo e a dimensões muito variadas da realidade que trata, será divulgado por partes. Sendo matéria sensível aquela que se invoca, é aqui tratada como testemunho de alguém que viveu o período objecto de análise e que dele faz a sua leitura.)

sexta-feira, janeiro 28, 2011

O Poder Real em Portugal 2010 e a Crise (9ª parte)

[Continuação]
A fraca democracia que se vive em Portugal 2010...
A ilustrar esta afirmação está a seguinte notícia:
Clube dos jornalista 14 de Fevereiro de 2010, “Portugal amordaçado”: "Ver umas dezenas de cidadãos, muitos deles com colunas em jornais de grande audiência, ocupando espaços televisivos, escrevendo blogs alojados na plataforma da Portugal Telecom, com programas de rádio, a manifestar-se contra a falta de liberdade de expressão é bem a prova de que a asfixia impera."

Em jeito de CONCLUSÕES
1- Para o Bem e para o Mal, o 25 de Abril de 1974 produziu em Portugal um “trambolhão” que só tem par no que se produziu na China, na época da Revolução cultural. Os portugueses, mormente os jovens, não estão conscientes deste facto, até porque na Escola esse facto lhes é ocultado ou mal contado. Os próprios dirigentes europeus também não têm consciência do que o 25 de Abril produziu em Portugal. Apenas têm uma vaga ideia de que houve uma “Revolução dos Cravos” em Portugal, país pequeno (a “colonizar”), na periferia da Europa, um zero à esquerda em todos os aspectos (económico, cultural, etc.). Compete aos Homens e Mulheres de Estado (há pouco(a)s que queiram “dar a cara”) de Portugal fazer valer mundialmente a posição de Portugal que, afinal, é Centro do Mundo, porque: tem o maior “porta-aviões” do Globo (os Açores) no meio do Oceano Atlântico; pode e deve unir-se com algumas das maiores potência emergentes, a começar pelo Brasil; pode e deve tornar fáceis e baratas as ligações navais do Extremo Oriente com a Europa, através de portos como o de Sines e linhas de caminho de ferro TGV, não tanto de passageiros mas mais de mercadorias; pode e deve explorar a sua grande plataforma continental (Portugal tem muito mais mar seu do que terra) evitando que, entretanto, outros países da Europa tomem conta dela; pode e deve contribuir para o combate à entrada na Europa do tráfico de drogas, armas, etc., através de acções conjugadas de todas as polícias (as forças armadas estão longe de fazer o que podem e devem...); etc., etc..
2- A questão do Poder Real em Portugal depois do 25 de Abril até hoje está por estudar, discutir e divulgar.
3- Há uma “maioria silenciosa e comodista” de cerca de 60% da população em condições de votar que não vai às urnas e despreza, ostensivamente, a classe política (tem razões para isso, mas, no seu próprio interesse, não deve fazê-lo). O ensino em Portugal, especialmente o Básico + o Secundário (B+S), contribui para esta situação. (Haja em vista, por ex., o desprezo com que é tratada a disciplina de Filosofia e os erros no programa, etc.).
4- O sistema eleitoral é de tal ordem mau que um deputado natural e residente no Algarve pode vir a ser deputado pelo círculo eleitoral de Viana do Castelo...[há um completo divórcio entre os “Representantes do Povo” no que é suposto ser o órgão máximo do Poder (a Assembleia da República) e os elementos desse Povo].
5- O sistema de ensino B+S em Portugal é de tal ordem mau, que um professor(a) da “Instrução Primária”, natural e residente no Algarve, pode vir a ser colocado(a) em Viana do Castelo. Por mando da FENPROF, tudo tem de estar centralizado em Lisboa...[Quem será capaz de repor nas escolas B+S a autoridade dos professores? Quem será capaz de descentralizar o ensino B+S em Portugal? Quem será capaz de impor exames nacionais bem organizados no 4º, 6º , 9º, 11º e 12º anos de escolaridade? Quem será capaz de introduzir no ensino Básico ou no Secundário uma disciplina de “Economia” e outra de “História das Religiões do Planeta” e “varrer” desse ensino as disciplinas inúteis de “Educação Cívica”, “Projecto”, etc.? Quem será capaz de introduzir um Ensino Técnico (Industrial e Comercial) de nível que produza Técnicos Médios de interesse para as Empresas Industriais e Comerciais (Montadores Electricistas, Mestres de Oficinas Mecânicas, Mestres de Oficinas de Automóveis, Mestres de Fábricas de Carrocerias, Mestres de Equipamentos de Ar Condicionado, Mestres de Oficinas de Mobiliário, Técnicos de Contabilidade Industrial e Comercial, Técnicos Bancários, Topógrafos, etc. etc..? Quem será capaz de introduzir o ensino de Artes (de Artífice) e Ofícios no sistema de ensino geral para as pessoas que, não sendo dotadas de poder de abstracção, são, todavia, dotadas de “mãos” (habilidade) e, têm por ventura, espírito inventivo e/ou inovador?. etc., etc..]
6- Uma completa “revolução” no ensino, principalmente no B+S, é condição indispensável para se sair da Crise Económica (e Social). Não se vê no horizonte forma de se conseguir esse objectivo. Seria necessário “varrer” a “mobília velha” que existe no MEN e colocar lá quem possa ver o Mundo Global onde os nossos filhos e netos têm de viver e saiba ensiná-los para enfrentarem essa situação. O melhor BEM “material” de um País é o nível educacional dos seus cidadãos, já que, quando não se possa exportar mercadorias, exporte-se “gente” qualificada com grande probabilidade de sucesso em qualquer parte do Mundo. (Copie-se o que se passa no futebol mundial).
7- Ao contrário do que a maioria dos responsáveis governamentais pensa, os “Profissionais nacionais e internacionais de Gestão de Financiamentos” estão bem a par do impasse no Poder Real que existe em Portugal e que impede uma verdadeira Reforma Estrutural da Economia Portuguesa (não as reformas parciais e “cosméticas” que têm sido ensaiadas). Daí que, enquanto os principais partidos se não entenderem e fizerem acordos sérios “extra-parlamentares”, compromissos conjuntos que podem ser tomados em qualquer altura (independentemente de eleições e de datas para as mesmas), as taxas de juro para a Dívida Pública não deixarão de aumentar até virem os “Homens Sem Rosto” meter os nossos dirigentes na ordem...
[Continua]

JBM

(Artigo de opinião/testemunho do autor identificado. Devido à extensão total do texto, que se reporta a um período amplo e a dimensões muito variadas da realidade que trata, será divulgado por partes. Sendo matéria sensível aquela que se invoca, é aqui tratada como testemunho de alguém que viveu o período objecto de análise e que dele faz a sua leitura.)