Já não existem dúvidas de que a pobreza e a desigualdade são um dos principais problemas que afectam as nossas sociedades. Em Portugal, estes problemas têm-se agudizado na última década. Tal como aconteceu noutros países, a situação revela, entre outros aspectos, o facto de o modelo de crescimento económico adoptado e as políticas públicas que o enquadram terem permitido o desenvolvimento de desigualdades de rendimento e de situações de pobreza. O emagrecimento do Estado-Providência e a crescente privatização de entidades fornecedoras de bens públicos deverá, a curto prazo, fazer-se sentir, em Portugal, na extensão e severidade da pobreza e da desigualdade.
Portugal é um dos países da União Europeia que continua a apresentar uma significativa assimetria na distribuição dos rendimentos dos agregados familiares, visto uma das mais comuns medidas de desigualdade de distribuição do rendimento, o coeficiente de Gini, se ter cifrado em 35.8% em 2007, versus 30.6% para o conjunto dos países da União Europeia (apenas três países da Europa de Leste registaram valores mais elevados do que Portugal). De acordo com o estudo publicado em 2010 pelo I.N.E. (Sobre a pobreza, as desigualdades e a privação material em Portugal), apesar da desigualdade ter vindo a diminuir progressivamente desde 2004 (38.1% àquela data), Portugal, em 2008, com um coeficiente de Gini de 35.4%, deixava transparecer a persistência de uma parcela importante da população (17.9%) que se encontrava em situação de risco de pobreza.
Mesmo com a melhoria a que se vem assistindo nos últimos anos, isto significa que, em 2008, o rendimento anual para 17.9% da população era inferior ao limiar de pobreza, ou seja, 4969 Euros (414 Euros mensais). O risco de pobreza dos idosos também decresceu entre 2003 e 2008 de 28.9% para 20.1% (I.N.E., 2010). Não obstante, e quando comparamos este grupo populacional com o total da população residente, o indicador respectivo revelava que este grupo enfrentava, em 2008, um risco mais elevado de pobreza (20.1% versus 17.9% para o total da população residente).
Por outro lado, em 2008, o risco de pobreza dos agregados sem crianças dependentes (14.9%) era inferior ao dos agregados com crianças dependentes (20.6%). Os riscos de pobreza mais elevados, correspondiam a: idosos que viviam sós (32.7%); famílias constituídas por um adulto com crianças dependentes (famílias monoparentais - 38.8%); e famílias com dois adultos e três ou mais crianças dependentes (42,8%). Este é um cenário existente já desde, pelo menos, meados dos anos noventa do século XX.
As crianças eram, em 2008, o grupo etário que revelou um maior risco de pobreza (mais de uma criança em cada cinco em situação de privação), coincidindo com a evolução mais desfavorável desde 2004.
Eram os indivíduos cujos agregados residiam em áreas densamente povoadas aqueles em que o rendimento era superior ao rendimento médio auferido pelo total da população residente (mais 1 780 euros anuais). A Região Norte, desde, pelo menos 2001, e de forma mais vincada, desde 2004, que tem estado pior posicionada no panorama português em vários indicadores, estando entre eles, a taxa de desemprego. Em 2007 e 2009 registou as mais elevadas taxas de desemprego a nível da NUTS II e em 2010 foi apenas ultrapassada pela região do Algarve (12.6 contra 13.4%), conduzindo ao aumento do risco de pobreza.
Que fazer perante tal cenário? Uma das soluções remete-nos para a substituição dos jardins por pequenas hortas, apostando na produção para auto-consumo, transformação a que se vai assistindo já nalgumas freguesias de Braga. Voltando aos tempos em que parte da população complementava os seus mínguos salários com as couves, o cebolo, as alfaces ou mesmo os tomates, isto é, em que as actividades no campo eram ocupações de fim de dia ou de fim-de-semana, que constituíam um bom contributo para uma alimentação mais saudável e ajudavam a contrariar uma vida sedentária. Mas será que a população mais jovem está preparada para tal? A necessidade aguça o engenho, diz o povo e com razão, mas a geração à rasca estará disposta a regressar à terra, quando a circunscrevemos, cada vez mais, ao aconchego da casa?...
Paula Cristina Remoaldo
[artigo de opinião publicado na edição de hoje do Suplemento de Economia do Diário do Minho]
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