Espaço de debate de temas de Economia Portuguesa e de outros que com esta se relacionam, numa perspectiva de desenvolvimento

sábado, março 23, 2013

Impactos do envelhecimento na sociedade portuguesa

Resposta às questões formuladas pela jornalista Lurdes Trindade, do Jornal de Leiria, endereçadas em 2013/03/15
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1 - Quais os impactos do envelhecimento na sociedade portuguesa? 
R: O envelhecimento da população portuguesa acarreta diversos tipos de impactos, estando entre eles os seguintes: i) a dificuldade crescente em manter sustentáveis os sistemas de saúde e de segurança social, face aos desequilíbrios que tendem a gerar-se entre os activos que geram os descontos (receitas) e os reformados que vivem das pensões pagas com essas receitas e são beneficiários passivos desses sistemas; ii) a tendencial perda de dinamismo social, económico e empresarial, pressupondo-se que populações mais jovens são mais produtivas, têm menor aversão ao risco e tendem a ser mais criativas; iii) uma descida no consumo, já que uma população envelhecida é uma população que tende a consumir menos produtos e esta baixa de consumo é visível a partir, sensivelmente, dos 50 anos de idade; iv) a alteração nos hábitos e nos padrões de consumo, isto é, os tipos de bens e serviços consumidos e os modelos de convívio social alteram-se com a idade; e v) a perda de vitalidade demográfica, com expressão em taxas de natalidade muito baixas e, logo, num efeito cumulativo de acentuação dos desequilíbrios entre população idosa e população jovem, e entre população em idade activa e população aposentada, o que, por sua vez, questiona redobradamente a capacidade de manter sustentáveis os sistemas públicos de saúde e de segurança social.

2 - Considera que a sociedade portuguesa está a preparar-se adequadamente para este fenómeno que apesar de tudo não é recente? 
R: Não, de modo algum, até porque é uma realidade bem do presente a “fuga” para o exterior do país de população jovem, ainda por cima detentora de qualificações académicas mais elevadas do que a média e que poderiam, por um lado, ajudar a combater a redução da natalidade e, por outro lado, contribuir para o equilíbrio financeiro da segurança social. Face à falta de oportunidades de emprego existentes em Portugal e face à incapacidade do governo de passar para a sociedade sinais de esperança, essa “fuga” é perfeitamente compreensível. A perda de dinamismo demográfico também se podia combater com o acolhimento de população estrangeira, normalmente jovem e mais fecunda mas, do mesmo modo que para os nacionais, era necessário que se criassem oportunidades de emprego que os atraíssem e fixassem entre nós. Também as políticas de apoio à natalidade e à infância mantidas em Portugal, aparte terem sido sempre razoavelmente inconsistentes, sofreram imenso com as políticas recentes de angariar receitas e descartar encargos públicos a todo o custo. 

3 - Com o envelhecimento, surgem também as doenças, as demências, tudo associado a um contexto de maiores carências sócio-económicas. Assiste-se, pois, ao aumento do índice de dependência de idosos. Que solução Portugal tem para inverter esta situação? 
R: No essencial, a resposta a esta questão foi dada quando enderecei as duas questões anteriores. Sublinho: por um lado, importa reverter esta situação de ausência de crescimento económico, de criação de emprego e de vazio de esperança que está instalada. Com o crescimento da economia vem o crescimento das oportunidades de emprego e da esperança de se alcançar melhores níveis de bem-estar económico e social. Não se redistribui o que não há, seja em favor das crianças e jovens, seja tendo como destinatária a população mais idosa. Por sua vez, o emprego e a esperança são a resposta para o rejuvenescimento da população, pela via da natalidade e da atracção de população imigrante, e para que seja assegurada a viabilidade financeira dos sistemas de saúde e de segurança social. 
A solução que vem sendo prosseguida de aumentar a idade de reforma e de reduzir pensões e apoios sociais é uma falsa resposta. Que sentido faz aumentar o limite de idade a que alguém pode aceder a uma pensão de reforma quando o principal drama que o país vive é o da inexistência de oportunidades de emprego? 

4 - Considera que a segurança social está em causa? 
R: Se estamos a falar da viabilidade a médio e a longo prazo, a resposta só pode ser afirmativa. Mesmo que as receitas geradas até um passado recente possam ir cobrindo os encargos (acrescidos) do presente, se não for possível preservar o equilíbrio entre o dinheiro que vai entrando e a despesa que decorre dos encargos com pensões de reforma, saúde e apoios aos desempregados, a insustentabilidade do sistema emergirá a médio prazo, um médio prazo muito próximo, como tem sido referido amiúde na comunicação social. 

 5 - O futuro das nossas famílias está comprometido? 
R. Com estas políticas, não é só o futuro das nossas famílias que está comprometido. É o bem-estar mínimo presente das famílias que está comprometido e é o futuro do país que está em causa. Falo do futuro do país no sentido, desde logo, da soberania, que nesta altura está em grande medida hipotecada aos credores financeiros externos, mas que será reforçadamente questionada se a economia nacional não for capaz de entrar rapidamente num ciclo de crescimento que permita, a pouco e pouco, deixá-la menos refém dos apetites e comandos financeiros exteriores. Conforme creio ser bem conhecido, a dívida pública total não cessa de crescer, pese ou, diria antes, por força da “ajuda” financeira externa e das políticas que aquela traz associadas. 

6 - Por fim, um conselho para quem está a envelhecer.... 
R: Num quadro económico e político como o actual, é difícil dar conselhos que não apontem no sentido da luta que importa dar às políticas sociais e económicas que vêm sendo implementadas. Estou absolutamente convencido que não haverá resposta para as dificuldades que atingem as famílias e empobrecem Portugal fora de um cenário de alteração do quadro político vigente. Nesse sentido, como dizia há alguns dias numa conferência em que participei, ouvir-se cantar nas ruas “Grândola, vila morena” é um sinal de esperança.

Braga, 18 de Março de 2013 

 J. Cadima Ribeiro 
 (Economista. Professor Universitário)

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