«1. Quais os factores que considera serem os principais
responsáveis pela actual crise?
A crise atual
é o resultado conjugado de: i) causas externas (a crise financeira e económica
internacional); causas internas de natureza económica (o esgotamento do modelo
de acumulação que vigorou até final dos anos 90 do séc. XX e da ausência de uma
política industrial ativa); e iii) causas internas de natureza político-institucional,
decorrentes da fraca qualidade das lideranças políticas e da ausência de um
projeto coletivo para o país.
2. O que foi feito para a evitar?
Não foi feito
nada. Pelo contrário, políticas seguidistas de orientações externas (da UE) e
uma lógica político-partidária estreita, ajudaram a aprofundar o vazio de
respostas e de soluções.
3. Na sua opinião, que medidas deveriam ter sido
adoptadas?
Portugal nunca
devia ter deixado de ter uma política industrial (e agrícola) e ter reorientado
cedo o seu posicionamento na divisão internacional de trabalho, não ficando à
espera de evoluções no âmbito da OMC e da integração de novos países na UE. A
aposta em novos e produtos e serviços e reposicionamentos na cadeia de valor deveriam
ter acompanhado o esforço que se fez em matéria de qualificação dos recursos
humanos e provisão de infra-estruturas. Essas eram peças centrais da política
industrial de que se abdicou. Há dimensões ao nível da reorganização do Estado e
gestão dos serviços que deveriam também ter avançado, nomeadamente, a
descentralização e a regionalização.
4. Considera que, aplicadas as mesmas, poder-se-ia ter
evitado os efeitos nefastos que se sentem correntemente?
Em diálogo com
os agentes económicas e numa relação muito mais próxima com a sociedade, muito
poderia ter sido feito. Precisaríamos de esclarecimento e capacidade de liderança
nas instâncias políticas, que não existiu e continua a não existir.
5. A austeridade é o caminho a seguir?
Os dados mostram que a austeridade, interpretada como tem sido, é o caminho
do desastre. Boa gestão e gestão esclarecida não são austeridade, pelo menos tal qual ela tem sido interpretada pelo governo em funções.
6. Os impactos da mesma na sociedade podem ser
minimizados?
Poderiam, se o
governo o quisesse. Parece haver uma agenda política que vai em sentido
contrário, nomeadamente quando vê hipóteses de negócio em tudo quanto são
serviços públicos. Aparte isso, há uma coisa que se chama sensibilidade
social, de que as políticas deste governo andam arredias.
7. Quais as políticas que classifica como fundamentais para fomentar o
crescimento sem comprometer as obrigações nacionais perante os nossos credores?
As políticas
deveriam ser percebidas e partilhadas, solidariamente, pelas empresas, cidadãos
e governo, o que obrigaria a montar um processo de construção das políticas que
nunca foi ensaiado em Portugal. É preciso ter uma política industrial, ter uma
política agrícola, ter uma política de qualificação dos portugueses, ter uma
política de inovação, uma política social, etc., isto é, ter uma estratégia
para a economia e para o país. Não tendo nada disso, como se pode querer ter a
solidariedade e a compreensão geral dos portugueses e das instâncias
internacionais, credoras ou não. Resta uma política de curto-prazo, seguidista,
de gente sem ambição e sem projeto para o país, embora o possam ter para cada
um dos intérpretes das políticas em execução.
Braga, 7 de
Novembro de 2013
J. Cadima Ribeir»
[Resposta sumária a um conjunto de questões formuladas por um aluno do ISCTE (FMS), datadas de 2013/11/05]