Participei há dias numa conferência sobre a temática do “Território e do Desenvolvimento Regional”, em Braga, organizada por dois centros de investigação (CICS e NIGP) da Universidade do Minho. Foi-me grato verificar o interesse que o evento suscitou, tendo aí encontrado gente que se deslocou de vários pontos do país, incluindo Leiria.
Nos termos do que era proposto no folheto de divulgação, pretendia-se “proporcionar uma oportunidade de reflexão sobre os fenómenos do desenvolvimento local e regional e as suas diversas dimensões”. Em conformidade, as temáticas escolhidas procuravam “atender aos impactos do global sobre o local e vice-versa, passando pela participação democrática no desenvolvimento […], e os sistemas de conhecimento”.
Estive no evento como conferencista e como participante atento ao que foi sendo dito. Foi desta última dimensão que retirei os maiores benefícios, aparte as notas que suportam uns quantos comentários que aqui produzo.
A conferência de abertura esteve a cargo de Tomas Villasante, professor da Universidade Complutense de Madrid, que versou o tema Democracias Participativas e Desenvolvimento Sustentável, matéria(s) de inquestionável actualidade e pertinência social, numa altura em que a democracia representativa enfrenta enorme descrédito. Esse descrédito tem variadas razões mas, em primeiro lugar, será talvez fruto do sentimento que se instalou em grandes franjas da população portuguesa, e não só, de que quem comanda as nossas vidas são interesses mais ou menos obscuros, corporizados nalgumas organizações internacionais e grupos económico/financeiros nacionais e internacionais, referidos comummente como mercado(s).
Dizia a propósito o mencionado conferencista que o sistema político não é ágil nem é tão eficiente como o são os mercados e que, como tal, as respostas que está capaz de dar às alterações dos contextos socioeconómicos pecam por um enorme desfasamento temporal. Mais acrescentava que, fruto desse desencontro, “os mercados e os governantes têm medo das pessoas”. Isso leva-os (aos governantes, entenda-se) a criarem mecanismos de filtragem da opinião e sentimentos dos cidadãos, de que a democracia representativa é instrumento e expressão institucional. Nesse quadro de leitura de situação, reportando-se a Espanha, mas podendo reportar-se com idêntica propriedade a Portugal, concluía que os maiores problemas daquela sociedade, na hora actual, são a crise económica, o desemprego e a classe política.
O movimento dos “indignados” seria assim filho legítimo da ditadura que temos, que é a dos mercados e de poderes políticos que, reclamando-se de representativos, não representarão senão os interesses desses “mercados” e dessa classe política decadente, que tenta a todo o custo perpetuar-se.
No mesmo painel, houve também lugar para a intervenção de Domingos Santos, professor do Instituto Politécnico de Castelo Branco, em que o foco da comunicação foi a economia do conhecimento, reportada aos contextos territoriais.
A abordagem deste e do primeiro orador mencionado acabaram por ter em comum a ideia de falta ou falha de comunicação entre políticos e pessoas (cidadãos, actores económicos comuns). Essa constatação apareceu verbalizada na afirmação de que “os políticos não ouvem as vozes dos clientes”. Dessa realidade seriam expressão múltiplas políticas implementadas em Portugal, de que reteve como exemplo os PEDIPs e os PEDAPs, quer dizer, políticas construídas de cima para baixo, alheadas das percepções dos agentes e da urgência que o país vive de se tornar mais competitivo.
Este discurso tinha como elemento estruturador a ideia de que “é o meio inovador que produz empresas inovadoras” e, assim sendo, a questão que importava pôr era a de “como é que o meio se pode organizar para aprender colectivamente”, ao invés de se achar que são replicáveis realidades como as de Silicon Valley, Route 128 ou Sophia-Antipolis, ou que a saída está em sectores de ponta, como se não fossem sectores de ponta os têxteis funcionais ou os materiais compósitos, entre outros.
A conferência serviu bem os propósitos para os quais foi promovida. Pena foi que dela, e de tantas outras, pouco transpire para a opinião pública, que mereceria ser muito menos sujeita à intoxicação que lhe chega diariamente pela comunicação social via fazedores de opinião, pagos para lembrar ao cidadão comum que a crise, o desemprego, as dificuldades que enfrenta são exclusivamente culpa sua.
J. Cadima Ribeiro
(artigo de opinião publicado em 2011/11/10 no Jornal de Leiria, no quadro de colaboração regular)
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