Espaço de debate de temas de Economia Portuguesa e de outros que com esta se relacionam, numa perspectiva de desenvolvimento

quinta-feira, julho 12, 2012

Diminuição da população em Portugal e aumento do envelhecimento

P: Que impactos podem ter estas tendências [diminuição da população em Portugal e aumento do envelhecimento]? 
R: Estes fenómenos de decréscimo continuado das taxa de natalidade e de aumento da esperança média de vida têm razões várias, de natureza cultural, social, económica e financeira. Os impactos estão e continuarão a sentir-se, igualmente, nestas diferentes dimensões da vida social. Em concreto, têm reflexos na adopção de novos modelos de vida e de consumo, na produtividade e espírito empreendedor da economia, no tipo de equipamentos sociais que se tornam necessários, na estrutura da despesa pública e na sustentabilidade dos sistemas de segurança social. 

P: Que factores mais têm pesado para esta curva acentuada de envelhecimento? 
R: Este fenómeno deve-se ao contínuo decréscimo da taxa de natalidade, à redução da taxa de mortalidade e ao aumento da esperança média de vida. A taxa de natalidade passou de 28 nascimentos por 1000 habitantes em 1935 para 9,5 em 2010, isto é, praticamente três vezes menos. Associado a esta redução do número de nascimentos, esteve o declínio do Índice Sintético de Fecundidade, que nos últimos anos se tem situado constantemente abaixo do limiar mínimo que permite a renovação de gerações (cerca de 2,1 filhos por mulher em idade fértil). Em 2001, o nível de fecundidade entre as mulheres de origem portuguesa situou-se em 1,5, o que foi parcialmente compensado pelas mulheres de nacionalidade estrangeira, que atingiu os 2,4. 
 A esperança média de vida em Portugal era, em 1960, de apenas 61 anos para os homens e 67 anos para as mulheres, enquanto que em 2005 atingia 81 anos para as mulheres e 75 para os homens. O acréscimo da esperança média de vida resultou, entre outras razões, da melhoria das condições de vida, dos progressos na medicina, da melhoria da assistência médica, do alargamento dos sistemas de protecção social, da alteração de hábitos alimentares e outros. 

P: Que país temos hoje? E teremos daqui a 20 anos? Cinco idosos por cada jovem? 
R: Foi em 2000 que pela primeira vez o número de jovens em Portugal foi superado pelo número de idosos. Em 2005, os nascimentos foram pouco mais do que as mortes e o fluxo de imigrantes diminuiu face a valores de anos antecedentes. Entre 2005 e 2010, a proporção de jovens na população residente total decresceu de 15,6% para 15,1%. No mesmo período, a proporção de indivíduos em idade activa (população na faixa etária dos 15 aos 64 anos de idade) também se reduziu de 67,3% para 66,7%. 
Em trinta anos, a percentagem de portugueses com mais de 65 anos passou de 11% para 17,5%. Mantendo-se esta tendência, segundo estimativa do Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2050, cerca de 80% da população portuguesa apresentar-se-á envelhecida e dependente, e a idade média poderá situar-se próxima dos 50 anos. 

P: De que forma se podem inverter estes dados? 
R: Uma reacção óbvia será pensar que a solução para o envelhecimento poderá passar pelo regresso a níveis de fecundidade mais elevados. Acontece entretanto que é notória a pouca atenção que em Portugal se presta às políticas sociais e da família, havendo necessidade de mais do que duplicar o orçamento dedicado ao apoio às famílias com filhos se o intuito fosse o de obter resultados similares aos que alguns dos seus parceiros comunitários têm vindo a conseguir, aparte a imperatividade de manter políticas menos errantes. A esta luz, em sentido inverso ao que seria necessário, o que se foi passando na última ano nesta matéria (de apoio à natalidade e à família, digo) configura um autêntico cenário de desastre. 

P: A sustentabilidade da segurança social fica definitivamente posta em causa? 
R: Com o envelhecimento da população e o consequente aumento do índice de dependência de idosos, assiste-se também ao aumento dos encargos sociais com reformas, pensões e assistência médica, e à crescentemente dificuldade de cobrir com recurso a um número reduzido de contribuintes (população em idade activa) os encargos daí derivados. Fica assim, efectivamente, em causa tanto a sustentabilidade do sistema de segurança social como a estrutura da despesa pública, sobrecarregada com a necessidade de aumentar os gastos com serviços, de saúde e outros, associados às populações mais idosas. Neste contexto, a resposta mais imediata ensaiada, tem sido adiar a idade legal de passagem à reforma, o que faz sentido mas não é resposta suficiente. 
Para aliviar as consequências futuras do processo de envelhecimento populacional, aparte o adiamento da idade de reforma, as políticas de incentivo à natalidade e a retenção no país de activos jovens, ao contrário do que ultimamente vem sucedendo (com evidente “complacência” das entidades públicas centrais), uma orientação possível será o recurso à chamada “imigração de substituição”. O recurso à imigração de substituição é também uma resposta ao envelhecimento demográfico na medida em que se consiga assegurar que contingentes de imigrantes com uma estrutura etária e níveis de actividade mais favoráveis compensem o envelhecimento da população autóctone. Para tanto, é todavia absolutamente necessário repor a economia do país no trilho do crescimento, o que não se tem visto fazer nem se perspectiva quando venha a ocorrer. 

P: E ao nível social? Que consequências podemos esperar? 
R: Conforme se disse, o decréscimo das taxa de natalidade e o aumento da esperança média de vida têm reflexos na adopção de novos modelos de vida e de consumo, na despesa pública e na sustentabilidade dos sistemas de segurança social, na eficiência e competitividade da economia, nomeadamente. Por sua vez, as respostas de política para enfrentar estes problemas, têm que intervir igualmente em diferentes esferas, da imediatamente ligada à vida familiar e organização social, a aspectos cultura e de consumo. Não se atingirão resultados consistentes senão olhando e intervindo nessas diferentes dimensões. 
 Atentos os sinais dos últimos tempos, não há grande espaço para optimismo; quero dizer: não se pode fazer o discurso da necessidade de se alcançarem maiores níveis de fecundidade e simultaneamente desinvestir no que respeita a estruturas de apoio à infância e à própria natalidade; não se pode ambicionar ter uma economia mais competitiva, apostando em produtos e serviços mais sofisticados ao mesmo tempo que se desinveste na educação e na ciência e se aponta o caminho da emigração aos activos mais jovens e mais qualificados; não se pode atrair e reter quadros quanto a palavra esperança está ausente do discurso e deixou de ser norteadora da acção de política. 

J. Cadima Ribeiro

(resposta às questões da jornalista Rita Montez, da revista Visão, datadas de 2012/07/06)

1 comentário:

jota disse...

Plenamente de acordo. Uma entrevista realista, com uma analise realista da situação portuguesa do momento que vivemos!Gostava de ter lido alguma coisa nesta entrevista sobre o papel das instituções/empresas empregadoras relativamente aos seus funcionarios que se aposentam/reformam! Que preparação lhes é proporcionada? Que apoio lhes é dado? Sabemos que os 2 ou 3 primeiros anos apos a reforma são de tranquilidade e grande satisfação, mas logo de seguida instala-se uma fase complexa de frustração, desmotivação, falta de autoestima, que leva as pessoas a adoecer mais rapidamente e entrarem numa fase de desilusão que frequentemente se torna perigosa em todos os aspectos da vida e da saude e bem estar das pessoas! Gostava de poder ler alguma coisa sobre estes aspectos