Espaço de debate de temas de Economia Portuguesa e de outros que com esta se relacionam, numa perspectiva de desenvolvimento

domingo, outubro 22, 2006

Um Nobel da Paz para a Economia

O Nobel da Paz de 2006 contraria as escolhas precedentes apoiadas fundamentalmente em escolhas politicas, constituindo deste modo, um reconhecimento internacional à economia como meio de eliminar as disparidades sociais e elevar a luta contra a pobreza a um patamar nunca antes atingido.
O economista Muhammad Yunus, fundador de uma organização solidária, é o grande mentor do conceito de micro crédito que traduz a possibilidade dos povos mais carenciados obterem financiamento para os seus projectos, sem qualquer garantia, baseando-se apenas na confiança. Esta organização que dá pelo nome de Banco Grameen foi fundada em 1976 no Bangladesh e 30 anos passados já emprestou 5 mil milhões de dólares, a pessoas que, de outro modo, não teriam acesso a crédito por recusa dos outros bancos sobre o pretexto de que eles o gastariam todo em bens de primeira necessidade e seriam incapazes de reembolsá-los. O facto mais curioso é que esta instituição, é financiada através da contracção de empréstimos junto de outros bancos bem como da emissão de obrigações, e recusa qualquer tipo de doação monetária.
O micro credito promove, assim, a fuga ao ciclo vicioso da pobreza que está instalada nestes países, daí ser considerado um instrumento de combate á pobreza e exclusão social, incidindo este combate mormente ao nível das mulheres que representam um total de 94% dos clientes do Banco Grameen e, como o próprio Muhammad Yunus refere “O crescimento económico e a democracia não podem concretizar-se plenamente sem que as mulheres estejam em igualdade de circunstancias com os homens”.
O Banco Grameen valoriza a capacidade de iniciativa na criação de condições de desenvolvimento de pequenos negócios, permitindo a plena inserção no mundo do trabalho a pessoas menos favorecidas.
No nosso país, onde é uma realidade que um quinto dos portugueses vive no limiar da pobreza, o conceito de micro credito também se encontra presente, através da Associação Nacional de Direito ao Credito (ANDC), representante da filosofia de Muhammad Yunus, que desde a sua fundação em 1998, já ajudou a criar 630 empresas e 700 postos de trabalho, e mais recentemente através do Millennium BCP, que disponibiliza também uma linha de micro credito.
Na minha opinião, este projecto de micro credito permite realmente combater as desigualdades sociais, promovendo, com apenas uma pequena quantidade de dinheiro o desenvolvimento sustentado das condições socio-económicas das pessoas com poucos recursos que de outro modo, não teriam qualquer acesso ao mercado de trabalho. Com esta perspectiva, acho que a filosofia de doação (contrariada por Muhammad Yunus), que permite uma melhoria de condições a curto prazo, foi transformada numa filosofia de responsabilização que permite uma melhoria real e a longo prazo do nível de vida socio-económico.

Sara Vilaça

(doc. da série artigos de análise/opinião)

3 comentários:

Anónimo disse...

A economia, enquanto ciência, procura aumentar a qualidade de vida dos agentes económicos, proporcionando a melhor afectação possível aos recursos escassos, que pretendem satisfazer necessidades ilimitadas. Mas, por vezes nem todos os recursos são afectados da forma mais eficiente. A título de exemplo, temos, a capacidade humana. Num mundo regido por valores materiais, muitos recursos humanos não são utilizados, por vezes até são descriminados. Com a criação do micro crédito, de uma forma eficiente e inteligente pode-se usar os recursos humanos existentes até ao seu limite máximo. Se o mercado, não cria oportunidades aos agentes económicos com condições, capacidades, e sem garantias reais, para poderem desenvolver uma actividade económica, o banco Grameen surgiu dando essa oportunidade.
Como prova deste sucesso temos o facto de hoje, já outros bancos terem aderido ao sistema do microcrédito. Um primeiro passo em prol da ajuda, traz maiores benefícios à sociedade, do que outras actividades desenvolvidas pelos detentores de um “trono”.
Dado que estas pequenas actividades económicas foram testadas pelos proporcionadores do microcrédito, os agentes que se propõem a desenvolve-las, terão garantias de sucesso e serão cidadãos mais justos e transparentes, pois saberão honrar quem lhes deu a oportunidade de mostrar as suas potencialidades.
Será que o microcrédito, não poderá ser considerado como um investimento? De certo que é um gasto presente, mas que dará lucros num futuro, talvez próximo. E será que é um custo de oportunidade, será que haveria projectos mais eficientes onde investir este dinheiro? Talvez possamos considerá-lo num custo de oportunidade, presente, mas será que haveria algo mais eficiente que fazer a este dinheiro, será que esta oportunidade por ser única não terá efeitos muito mais significativos a longo prazo? Talvez devêssemos pensar desta forma e não continuar a deixar que seja o Estado o grande consumidor do dinheiro, a deixar que continue a aumentar as suas receitas, resolvendo apenas problemas no curto prazo…

Anónimo disse...

A economia é primariamente uma ciência social, que se preocupa em estudar a riqueza das nações, a distribuição dos rendimentos, assimetrias e disparidades as suas causas e consequências. Portanto, fazendo uma analise por esse prisma não será tanto de estranhar o facto de um economista ter ganho o Prémio Nobel da Paz, mas sim de perguntar: Só agora?
É portanto de saudar que a Função sueca se tenha lembrado do economista Muhammad Yunus, que pelo seu trabalho junto dos países em vias desenvolvimento, fomentado a política do micro crédito, tem tentado quebrar o bem conhecido ciclo vicioso do subdesenvolvimento. O micro crédito é uma forma de quebrar esse ciclo e permitir aos mais pobres, ou seja, àqueles que não têm capacidade de aceder ao crédito uma oportunidade de poderem investir e levar a cabo determinados projectos. Esta nova noção de ajuda aos países em vias de desenvolvimento tem permitido que as famílias gerem renda e consigam, muitas vezes, sair de uma situação de pobreza.
Assim sendo, é bastante justo que o Prémio Nobel da Paz tenha sido entregue a alguém que, ao longo de muitos anos, tem ajudado os países mais pobres.

Carla Almeida disse...

Na minha opinião este Nobel foi bem atribuído. O facto de algumas pessoas não terem bens para garantirem o crédito tornam-se casos inaceitáveis para muitos bancos, mas mereceram uma especial atenção por parte de Muhammad Yunus. Graças a ele muitas pessoas puderam orientar as suas vidas e muitas delas são casos bem sucedidos. Seria curioso analisar e comparar o crédito mal parado das instituições bancárias e das que concedem microcrédito. Acredito que será menor no último caso. Normalmente as pessoas com poucos recursos são mais humildes e se há coisa que têm é dignidade e cumprem os seus compromissos por mais que lhes custe. O que por vezes não acontece entre as classes médias e altas porque no seu meio a constituição de crédito assim como o seu não cumprimento estão banalizados. O Senhor Muhammad Yunus foi um justo vencedor porque deu oportunidade àqueles que por vezes são excluídos pela sociedade porque tiveram a infelicidade de nascer numa família pobre.