Espaço de debate de temas de Economia Portuguesa e de outros que com esta se relacionam, numa perspectiva de desenvolvimento

terça-feira, janeiro 11, 2011

O Poder Real em Portugal 2010 e a Crise (2ª parte)

[Continuação]
O 25 de Novembro de 1975 foi uma “Contra-revolução”, “rumo à Democracia”
A 25 de Abril de 1975 tiveram lugar eleições para a Assembleia Constituinte. A esmagadora maioria da população portuguesa votou no PS - que se tinha tornado progressivamente mais liberal nas suas posições ou, como se diria anos mais tarde, tinha «enfiado o socialismo na gaveta» - e no PPD, actual PSD. O Partido Comunista Português vê-se assim com uma modesta representação na Assembleia Constituinte. Os diversos grupos marxistas surgidos com o 25 de Abril (UDP, MES, FSP, LCI, etc.) têm apenas votações residuais.
Em consequência dos resultados das eleições e de visões diferentes quanto ao futuro do país entre os principais partidos (PS e PSD) e o primeiro-ministro Vasco Gonçalves (“Companheiro Vasco”), surge um conflito de legitimidade [a eleitoral, a dos partidos, e a revolucionária, a do MFA (Movimento das Forças Armadas, que foi o quem fez o 25 de Abril) e o Conselho da Revolução)].
Logo no 1º de Maio isto torna-se manifesto no conflito aberto entre o PS, opositor da unicidade sindical, e o PCP, apoiado pelo Conselho da Revolução, defensor da existência de uma única central sindical.
Ainda em Maio surge também o “Caso República”. Uma greve de tipógrafos do jornal República, afectos à UDP (União Democrática Portuguesa, à esquerda do PCP), põe em causa a direcção do jornal, alinhada com o PS. O caso servirá de pretexto ao PS para lançar um ataque ao PCP e ao governo de Vasco Gonçalves que, por demissão do general Spínola, foi nomeado 1º Ministro pelo Presidente da República, general Francisco da Costa Gomes.
O Processo Revolucionário conduzido por Vasco Gonçalves é assim contrariado não só pelos sectores “reaccionários” da sociedade portuguesa (a Igreja Católica e alguns grupos saudosos do Estado Novo) mas também, embora ainda não abertamente, pelos principais partidos políticos (PS e PSD). Isto leva a uma escalada nas tomadas de posições de Vasco Gonçalves e do COPCON [Comando Operacional do Continente, uma estrutura de comando militar para Portugal continental (enquadrada no Estado-Maior General das Forças Armadas) criada pelo MFA], investido pela Aliança Povo/MFA. Vasco Gonçalves sente-se assim legitimado para levar avante o processo socializante.
Segue-se o chamado “Verão Quente” (Maio - Setembro de 1975). O PCP consegue, com base num boato que dizia que militares spinolistas pegavam em armas e que tentavam, a 11 de Março de 1975, fazer um golpe de Estado, que Vasco Gonçalves radicalize o Processo Revolucionário e nacionalize os bancos, as seguradoras e grandes empresas, tais como a CUF (Companhia União Fabril), a Lisnave e outras empresas de grande dimensão da “cintura industrial de Lisboa” e não só. Os proprietários foram obrigados a fugir de Portugal e alguns altos quadros que ficaram foram submetidos aos maiores vexames, como seja o de terem de varrer e fazer limpeza das casas de banho ao lado do pessoal próprio desse ofício. Coisas semelhantes aconteceram com médicos dos principais hospitais do País. Era a Revolução Cultural à chinesa no seu auge. Era o “Princípio da Igualdade” no seu “melhor”...
Ao mesmo tempo, o PCP criava as famosas UCPs (Unidades Colectivas de Produção) nas herdades do Alentejo e mandava para lá os seus comissários para as dirigir, obrigando os proprietários a fugir do País. Tratava-se, dizia-se, da “apropriação dos meios de produção pelos trabalhadores”. No “consulado” de Vasco Gonçalves, chegou-se mesmo a falar de “Ditadura do Proletariado”... . Mais ainda, chegou a vir a público, e julgamos que chegou a ser decretada, a proibição dos operários de fazerem greves, pois “os operários eram agora donos dos meios de produção e, por isso, não fazia sentido fazerem greves, pois isso seria revoltarem-se contra si próprios.”
Grupos de militantes percorriam o País de lés a lés empunhando cartazes com “slogans” do tipo:

MFA, VASCO, POVO
POVO, VASCO, MFA
Força, Força Companheiro Vasco.
Nós Somos a Muralha d`Aço.


Ainda mais à esquerda, os SUV (Soldados Unidos Vencerão) exibiam o seu “Manifesto”. Neste manifesto, referiam que, "...considerando que já por diversas vezes fizemos cedências à burguesia nomeadamente ao submetermos a nossa luta à aliança com o MFA, que por causa das suas contradições e hesitações no passado, e de hoje estar ao serviço de elementos contra-revolucionários, nos tem valido não só o afastamento e hostilidade da população (especialmente dos nossos irmãos camponeses), como também a desmoralização de numerosos combatentes das nossas fileiras e o adormecimento perante a ofensiva reaccionária dentro e fora dos quartéis...", "...SUV luta com todos os trabalhadores pela preparação de condições que permitam a destruição do Exército burguês e a criação do braço armado do poder dos trabalhadores: o Exército Popular Revolucionário...", "...Sempre, Sempre ao lado do Povo é o nosso lema..." Setembro de 1975 (Conforme a Wikipedia). Os SUV pretenderam introduzir nas Forças Armadas, ou pelo menos no Exército, o princípio da “abolição de hierarquias” e “enforcar os burgueses na praça pública”, etc., mas não o conseguiram.
- O PCP também criava entretanto, de forma mais ou menos oculta , a “Associação (Sindicato) dos Juizes Portugueses”, que ainda hoje persiste.
Era o PREC (processo revolucionário em Curso”) na sua “melhor forma”.
[Continua]

JBM

(Artigo de opinião/testemunho do autor identificado. Devido à extensão total do texto, que se reporta a um período amplo e a dimensões muito variadas da realidade que trata, será divulgado por partes. Sendo matéria sensível aquela que se invoca, é aqui tratada como testemunho de alguém que viveu o período objecto de análise e que dele faz a sua leitura.)

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